Fundos de CRI assumem protagonismo na indústria imobiliária

Disparada de juros e inflação aumenta a atratividade dos papéis. Quais as tendências daqui em diante?

5 de agosto de 2022Mercado Imobiliário
Os fundos de investimento imobiliário (FII) lastreados em recebíveis do setor - mais conhecidos pela sigla CRI - ganharam espaço na indústria no decorrer dos últimos 15 meses, diante da disparada da inflação e do consequente aumento da Selic. Hoje, a categoria já representa cerca de 45% do Ifix, índice oficial dos fundos imobiliários no Brasil, tornando-se, isoladamente, a maior classe de ativos.

Para especialistas ouvidos pelo GRI Club, a comparação com fundos de tijolo é até injusta no momento, considerando que os fundos de CRI são remunerados pelo IPCA ou pelo CDI. “Esses fundos estão surfando um cenário de originação em um momento de baixa e resultado em um momento de alta [de inflação e juros]. Eles estão no pico da rentabilidade”, afirma Rossano Nonino, sócio-diretor da Ourinvest Real Estate

Em um exercício compartilhado com a reportagem, o sócio da Faria Lima Capital, Vicente Nogueira, mostra que, no curto prazo, os fundos de CRI devem remunerar acima dos 11% ao ano, que é o spread entre um investimento atrelado à Selic - líquido de impostos - frente a inflação esperada no segundo semestre. 

“Olhando para 2023, 2024 e 2025, segundo o Boletim Focus, a diferença entre CDI e IPCA cai para 5,45%, 4,7% e 4,5%, respectivamente, ou seja, o spread líquido dos fundos imobiliários atrelados ao IPCA sobe substancialmente a partir do ano que vem”, explica Nogueira. 

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O Faria Lima Capital Recebíveis Imobiliários (FLCR11) tem surfado esta onda: com um terço dos recursos investidos em CDI + 6,5% e dois terços em IPCA + 9,3%, o fundo tem se destacado em relação a outras alternativas de investimento, com um dividendo de R$ 1,69 por cota pago no mês de julho. 

Um executivo de uma grande gestora que pediu anonimato, pois está em fase de captação, afirma que é difícil prever o tamanho da duração deste ciclo de alta dos fundos de CRI. “Vai depender da velocidade da queda na taxa de juros, e agora não só no Brasil, como em todo mundo”. 

Para ele, será mais difícil os juros caírem no país se houver alta da taxa nas economias mais desenvolvidas, que há mais de uma década as mantinham zeradas ou mesmo negativas. “Vai ficar menos atrativo investir no Brasil se nossa taxa de juros for próxima a de países mais estáveis, e aí o câmbio dispara, a inflação explode e não se consegue reduzir os juros de jeito algum”. 

Na avaliação de Rossano Nonino, a Selic deve parar de subir nos 13,75% recém-anunciados pelo Banco Central, e com o tempo os fundos de tijolo voltarão a desempenhar melhor. “Temos uma posição expressiva em CRI dentro de nosso fundo de fundos, mas pretendemos diminuí-la até o final do ano e ir trocando por tijolo. Entendemos que há uma boa perspectiva para o tijolo no médio e longo prazo, pegando a inflação do passado”. 

Para Vicente Nogueira, o protagonismo dos fundos de CRI vai continuar nos próximos anos, mesmo que haja uma redução na rentabilidade consoante um recuo da inflação e da taxa Selic. “Existe o argumento de que o FII de tijolo vai valorizar; acontece que a compra ocorreu com um cap rate de 6%, que não volta mais; agora, é de 8% a 10%, quer dizer, foi comprada muita coisa cara nesses fundos”, opina. 

Seja qual for a aposta, o fato é que as captações estão mais difíceis no momento. “Há fundos captando e devolvendo o dinheiro porque não conseguiram o mínimo necessário. Vimos recentemente alguns fundos de papel que acharam melhor devolver do que ter um um cheque muito pequeno para investir”, diz Juliana Mello, sócia-diretora de Novos Negócios da Fortesec Securitizadora

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A executiva explica que no contexto atual - de menor liquidez e maior aversão ao risco - os gestores de fundos estão mais cautelosos, o que se traduz em menor apetite e maior exigência por boas remunerações do capital. “O problema é que nem sempre essa conta fecha para o empreendedor”. 

“O mais louco disso tudo é que ainda tem muita empresa decidindo seguir com as operações porque o empreendimento está vendido e ela tem que entregá-lo aos compradores, então é praticamente trabalhar de graça, o que é ruim para o mercado”, continua a sócia da Fortesec. 

Segundo Nonino, que também é diretor do Secovi-SP, os recordes consecutivos de lançamentos e vendas nos últimos trimestres vão exigir recursos do mercado de capitais, já que os bancos não terão apetite para financiar todos os compradores de imóveis. “A incorporadora tem que repassar o cliente, senão precisará fazer o financiamento direto, mas ela não é banco, então, naturalmente, vai procurar as companhias securitizadoras”. 

“A gente continua com uma demanda muito alta em relação ao número de operações, só que os critérios são cada vez maiores, e a taxa que reflete o risco, atualmente, não é necessariamente uma taxa saudável para o empreendimento”, ratifica Juliana Mello

Números

De acordo com a Uqbar, no primeiro semestre de 2022, foram emitidos R$ 17,6 bilhões em Certificados de Recebíveis Imobiliários. Se o resultado se repetir no segundo semestre, o volume anual será inferior ao de 2021, quando atingiu o recorde de R$ 40,5 bilhões em emissões de CRI. 

“Apesar da queda, é um nível bem alto se comparado à média histórica até 2020, ano em que o volume de emissões foi de R$ 16,9 bilhões”, encerra Nogueira. 

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Por Henrique Cisman