Despoluição do rio Pinheiros: há como transformar o passivo em ativo?

Mercado imobiliário da região está otimista em relação ao projeto

1 de junho de 2021Mercado Imobiliário

Em abril, o governador de São Paulo, João Doria, prometeu a despoluição do rio Pinheiros e a revitalização das margens até dezembro de 2022, data do fim de seu mandato. Caso concretizado, o projeto representará um progresso para a capital paulista e valorizará o mercado imobiliário da região.

Roberto Lima, sócio-fundador e CEO da Autonomy Investimentos, confia na iniciativa. "Nas gestões passadas houve vários estudos, tanto do ponto de vista técnico quanto de recursos, e agora o esforço começou na prática. O primeiro passo é a despoluição do rio, para depois entendermos como a área pública será cuidada e explorada. Definitivamente, os passos estão sendo dados", diz. 

Uma das empresas que participou deste planejamento é a Benx. O diretor-geral da incorporadora, Luciano Amaral, garante que a empresa foi uma das financiadoras do diagnóstico das bacias dos rios Pinheiros e Tietê, feita pela Consultoria Falconi. O executivo acredita na conclusão do projeto, mas não agora.

"Com a questão da sustentabilidade cada vez mais forte, vide o movimento ESG [environmental, social and governance], em algum momento terá que acontecer a despoluição. Nunca é na velocidade que gostaríamos, mas o trabalho vem sendo feito. Nos finais de semana, a ciclofaixa nas margens do rio Pinheiros está sendo usada por muitos ciclistas, que já relatam a melhora do mau cheiro", afirma.

Ciclofaixa do Novo Rio Pinheiros. Crédito: Governo do Estado de São Paulo.

Caio Esteves, global managing partner of Placemaking da Bloom Consulting, também considera que, para ser devidamente concluída, a despoluição do rio Pinheiros levará mais tempo do que o prometido por Doria. Para o especialista, o projeto exige que o sistema de ocupação do território seja repensado.

”Não envolve apenas o tratamento de água, mas o planejamento urbano como um todo, incluindo saneamento básico e ocupação irregular. Hoje o rio é um passivo que separa a parte central da cidade dos bairros menos estruturados e valorizados. Temos que inserir o rio na paisagem urbana, transformando-o em um ativo de São Paulo e de todos os paulistanos", avalia.

Se por um lado o projeto pode não ser finalizado na gestão atual, por outro dificilmente deve sofrer um boicote político, de acordo com o CEO da Brookfield Properties, Roberto Perroni. "Pela importância, é uma iniciativa que deve ter continuidade nos novos governos, independentemente do partido", declara.

Investimento imobiliário na região

A Brookfield Properties investe há algum tempo na região da Marginal Pinheiros, no segmento de lajes corporativas. Em um de seus ativos, o Complexo 17007 Nações, a empresa está construindo uma estação de trem que fará parte da linha da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) que passa na margem do rio.

"Já que o prédio fica no meio de duas estações, com distância de três quilômetros entre elas, decidimos construir uma plataforma, com a CPTM ficando responsável apenas pelo desvio dos trilhos. É um investimento de mais de R$ 60 milhões, fora o terreno. A população ganha uma nova estação e nosso empreendimento acaba sendo valorizado, assim como toda a região", aponta Perroni.

Em caso de despoluição do rio, o executivo entende que este será mais um atrativo para as empresas se instalarem no local e assegura que a Brookfield Properties deverá aumentar o investimento na região da Marginal Pinheiros.

Segundo Amaral, o mesmo será feito pela Benx, que inclusive faz parte do Consórcio Parque Novo Rio Pinheiros. A iniciativa, em conjunto com a despoluição do rio, investirá cerca de R$ 30 milhões nos próximos cinco anos para implantação e manutenção de pista de caminhada, ciclovia, cafés e banheiros, além de construir acessos para a entrada do público ao local.

A empresa fez parte do chamamento por participar da construção do Parque Global, bairro planejado às margens do rio Pinheiros que unirá diversas forças do mercado imobiliário. "É o maior projeto imobiliário de todo o Brasil", aponta Amaral.

Outro importante empreendimento no local é o complexo corporativo Rochaverá, desenvolvido pela Autonomy Investimentos. Lima ressalta que a região da Marginal Pinheiros foi a que mais recebeu investimentos de mobilidade urbana na última década e considera-a propícia para a produção de diferentes tipos de imóvel.

"É uma área com muita infraestrutura, que tem a possibilidade de abrigar diversos segmentos do mercado imobiliário, como escritórios, residenciais, hotéis e shopping centers. A despoluição do rio Pinheiros será a cereja do bolo de uma das regiões mais prósperas da cidade", destaca.

Para Esteves, inclusive, a polivalência dos bairros faz parte do futuro das grandes cidades. "Com esse projeto pronto, a região não só terá vocação, como deverá abranger todos os segmentos. Hoje não há como pensar em bairros que desempenhem uma única função. É uma ideia ultrapassada", garante. 

Diante do objetivo de revitalizar a Marginal Pinheiros, ainda foi firmado um contrato de concessão da Usina São Paulo (de Traição), pelo prazo de 22 anos, em setembro do ano passado. Formado pelas empresas Kallis, Nacional Shopping e Reestruturação de Shopping Center, o consórcio deverá implantar lojas, bares e restaurantes no local.

Vista aérea da Usina São Paulo, no rio Pinheiros. Crédito: Empresa Metropolitana de Águas e Energia S.A.

Exemplos internacionais

Para ter sucesso na despoluição do rio Pinheiros e, quem sabe, também do Tietê, a cidade de São Paulo pode se inspirar em diversos projetos ao redor do mundo que recuperaram cursos d’água considerados biologicamente mortos. 

Talvez o mais famoso deles seja o rio Tâmisa, em Londres, que hoje abriga mais de 500 espécies de animais e é palco de navegação e prática de esportes. Ou o Rio Sena, que tem 1,3 mil quilômetros de extensão e foi despoluído através de um esforço coletivo entre Suíça, Holanda, França, Bélgica, Luxemburgo e Alemanha.

Mesmo assim, o urbanista Caio Esteves classifica o córrego Cheonggyecheon, em Seul, capital da Coreia do Sul, com o melhor exemplo para São Paulo. O projeto levou apenas dois anos e criou diferentes paisagens ao longo da cidade, transformando-se em um ponto turístico.

Cheonggyecheon, em Seul, Coreia do Sul. Crédito: leungchopan/Envato

"Estive lá e a revitalização é realmente impressionante. O rio poluído que cruzava a cidade se transformou em um cartão postal. É o principal modelo considerando a formação de um ativo de todos, uma vez que criou uma sensação de pertencimento na população", conclui.

Por Daniel Caravetti