Como será o último edifício comercial de Rafael Birmann

O precursor dos prédios de escritórios AAA no Brasil conta também o que planeja para o futuro.

13 de setembro de 2015Mercado Imobiliário

Rafael Birmann, considerado o precursor dos edifícios comerciais AAA no Brasil, está construindo aquele que diz ser seu último prédio, o B32. O empreendimento, na avenida Faria Lima, é objeto de grande expectativa, em especial porque se trata provavelmente também do último edifício com dimensões grandiosas naquela região – por conta da escassez de terrenos e de limitações colocadas pelo novo Plano Diretor paulistano.

Acompanhe o que presidente da Birmann SA planeja para para o projeto e para o seu próprio futuro:

GRI: O B32 tem sido apontado como o seu grande legado, mas o que significa na sua visão?
Rafael Birmann:
Esse projeto para mim foi uma grande realização e é extremamente desafiador. Quando o comecei, consegui comprar 35 terrenos e passei a pensar no que fazer com eles. Já tinha vivido anos difíceis, então foi uma espécie de recomeço. Eu queria voltar ao que fiz no passado, repensar os aprendizados, o que está certo e errado e melhorar o que tem que ser mudado. Minha grande descoberta nesse exercício, algo que passei a entender melhor, foi a questão urbana. Nosso setor tem uma péssima imagem, o que de um lado é injusto, mas de outro indica que precisamos agir com uma ética diferente. Não é só ganhar dinheiro em cima de um terreno, achar que todo terreno em São Paulo deve se tornar um empreendimento. Nem todo. Há aqueles que podem ser uma praça, um equipamento público. Não podemos agir como um bando de gafanhotos, e às fazer acho que fazemos isso.

GRI: Como esse entendimento está refletido no projeto?
RB:
Tivemos uma experiência interessante. Fizemos um trabalho de divulgação do B32 na vizinhança. Procuramos as pessoas para falar do projeto e o que aconteceu foi que o pessoal que a princípio era contra ficou a favor. Isso porque trouxemos uma proposta de integrá-lo com a cidade.

GRI: Essa integração vai acontecer por meio da praça aberta ao público no térreo?
RB:
Isso é muito importante. Se pararmos para observar, todos os prédios nas avenidas Faria Lima e Paulista são fechados, com muros, cercas ou algo que tenha essa função, como um jardim não convidativo ou um guarda que não deixa as pessoas entrarem. Veja que os jardins são desenhados para ocupar o espaço no lugar das pessoas, não para as pessoas os ocuparem. É para ficar bonito, mas há uma mensagem clara: 'não pise na grama'. Isso corroi a urbanidade, que se traduz por as pessoas conseguirem conviver, dialogarem umas com as outras, estarem juntas. Diante desse contexto, uma das coisas que imagino para o B32 é que seja uma espécie de exemplo. Vai resolver algo efetivamente? Não. Mas outros vão poder se inspirar e talvez fazer parecido.

GRI: Como esse conceito de ausência de muros está sendo recebido pelo mercado?
RB:
No mundo todo, a violência está caindo. Mas, no Brasil e na América Latina, está subindo. O que isso quer dizer? Em parte, nosso urbanismo é causa e consequência dessa violência. É um urbanismo que segrega. O muro não traz mais segurança, e sim aumenta a violência, levando a mais muros. É claro que há uma questão de mercado. Hoje em dia, o mercado quer o muro. Porém, precisamos tentar fazer a nossa parte, explicar para o mercado, educá-lo. Este prédio que estamos construindo, tenho certeza, vai funcionar melhor do que os outros. As pessoas vão ver que é aberto, seguro e agradável, que poderão descer do escritório e tomar um lanche na praça, sob o sol, coisa que todo mundo faz em Nova York, mas não aqui. Será que um banqueiro que queira alugar vai aceitar ter esse espaço público embaixo do prédio? Acho que pode haver alguma restrição, mas vale a pena enfrentar isso e educá-lo também.

GRI: Essa concepção é a maior diferença entre o B32 e outros tantos projetos que você idealizou e fizeram história nas décadas de 1980 e 1990?
RB:
Defini para mim mesmo que quero fazer um prédio que seja uma nova referência. Então, me coloquei todos os pontos a discutir: as especificações técnicas uma a uma, o design e o urbanismo, e o que chamo de paradigma de propriedade e gestão. Na parte dos aspectos técnicos, fiz uma espécie de revisão envolvendo ar condicionado, elevador, garagens etc. Garagem é uma preocupação porque, infelizmente, enquanto não temos transporte público de qualidade, é algo fundamental. Como o prédio é grande, teremos seis subsolos, mas não queremos que as pessoas fiquem dando voltas em cada um deles; por isso, inventamos rampas expressas, que vão diretamente para o terceiro subsolo. Outra novidade é que, para evitar filas de carros, nossa cancela estará no final da rampa e o veículo, enquanto a desce, já terá sua placa lida, para em seguida a cancela se abrir automaticamente.

GRI: E nas partes de urbanismo e gestão, o que pode adiantar?
RB:
Além do próprio B32, estamos mexendo também no entorno. Por exemplo, temos intenção de promover mudanças no B29 e no B31. A ideia é integrar o paisagismo com a nossa praça, criar cafés, colocar mesinhas. Não há nada mais urbano do que sentar num café olhando as pessoas passarem na calçada. Vamos para Paris e dizemos que isso é ótimo. Por que não podemos fazer aqui? A própria High Line, em Nova York, nada mais é do que uma calçada e conseguiu se tornar a parte mais visitada da cidade, com o simbolismo de pegar algo que estava morto e fazer reviver. Agora, com relação à parte de propriedade e gestão, entendo que prédios modernos não podem mais ser constituídos de unidades autônomas, com área comum e área privada. A gestão deles tem que ser discutida de outra forma. Reunião de condomínio não é um passo adequado. Avançaremos nisso mais para a frente, mas adianto que gostaria que os investidores convertessem o prédio num fundo imobiliário. Existem mil problemas legais, dificuldades para viabilizar essa ideia, mas estamos examinando isso.

GRI: Um ponto que gerou muita polêmica no projeto refere-se à compra da rua sem saída adjacente ao terreno, a Oswaldo Imperatrice. Em que situação está hoje essa questão?
RB:
Em julho de 2014, a Câmara de Vereadores, depois de um ano e meio, finalmente aprovou a desafetação e venda da rua. A formalização disso, que era para levar 30 a 60 dias no máximo, até hoje não se resolveu. Esse tem sido um transtorno gigante para a obra.

GRI: É verdade que o B32 será seu último prédio?
RB:
Sim. Não tenho mais idade e espero poder me dedicar a outras coisas. Há muito tempo meu sonho é encerrar essa parte, mas ele foi adiado por conta dos problemas por que passei.

GRI: O que está planejando para o futuro?
RB:
Não quero mais buscar ganhar dinheiro em outro empreendimento imobiliário, por mais que isso seja bom. Quero discutir a cidade.

GRI: Que tipo de projeto poderia lhe interessar?
RB:
Por exemplo, hoje se fala muito da Ceagesp (Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo). Há gente querendo pegar aquele terreno para fazer um empreendimento. Acho que seria um crime para São Paulo jogar a Ceagesp longe para fazer mais uns predinhos. Na minha visão, o entreposto teria que ser redesenvolvido como um grande centro de comércio, o que ele é, e um centro urbano de turismo e gastronomia. Este é um projeto que me interessaria muito.

GRI: Algo mais em vista?
RB:
Outra ideia eu gostaria de colocar em prática nasceu durante as discussões do B32 com a comunidade. Percebi que muita gente confundia a venda da rua Oswaldo Imperatrice com a do Quarteirão da Cultura, a duas quadras de distância. Trata-se de um terreno que pertence à Prefeitura e é ocupado por algumas entidades. Há um pessoal do mercado de olho naquele espaço, mas a comunidade ficou contra. Olhei para aquilo e vi que, como é hoje, não está bom, está subutilizado. É um espaço que pertence ao governo, mas cada uma daquelas entidades está fechada por muros. Nada daquilo é efetivamente público. Então, bolei a seguinte proposta: fazer uma parceria público-privada da Prefeitura com uma entidade e criar um projeto totalmente not for profit em benefício da cidade. A ideia seria construir dois prédios residenciais, cujos apartamentos seriam vendidos com resultado 100% público, e criar cerca de 20 mil m² de área pública, tudo novo e com um espaço equivalente a mais do dobro do atual. Teríamos uma praça aberta, fazendo um verdadeiro vetor de urbanismo neste bairro e ligando a Faria Lima ao Parque do Povo. Fiz um projetinho há um ano e ainda não tive retorno.

Entrevista concedida à editora-chefe, Giovanna Carnio