BID analisa desafios da infraestrutura na América Latina

Relatório traz panorama para países da região e aponta a infraestrutura como driver para o crescimento econômico.

10 de maio de 2019Infraestrutura


Considerada um driver fundamental para estimular o crescimento dos países latino-americanos, a infraestrutura regional ainda possui desafios importantes a serem superados em diversos segmentos, como transportes, energia e saneamento. Esse é o foco de análises complementares ao relatório macroeconômico para América Latina e Caribe 2019, produzido pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e divulgado no mês de abril.

Intitulado 'Construir oportunidades para crescer em um mundo desafiante', o informe aborda, principalmente, o impacto da desaceleração mundial na região, incluindo análises detalhadas sobre o panorama chinês, o lento crescimento registrado em economias europeias e também a situação dos Estados Unidos, que passa por movimento similar.

"Em comparação com o informe macroeconômico da América Latina e Caribe do ano passado, as estimativas de crescimento global se reduziram. No início de 2018, reinava um otimismo considerável (...). Segundo os prognósticos, o crescimento em 2019 seria de 3,9% e as projeções para Estados Unidos, China e Europa eram todas mais altas do que no início de 2018, em comparação a 2017. Contudo, um ano depois, o panorama da economia global mudou", diz o relatório. Para 2019, é considerada uma expansão de 3,5% para as zonas econômicas indicadas, e de 3,6% em 2020.

Para a região latino-americana, o relatório prevê um crescimento de mais de 2% neste ano, chegando a 2,5% em 2020. "Contudo, um conjunto de riscos potenciais ameaça a economia mundial e poderia ter um impacto negativo na região", aponta. Entre os pontos de atenção, está o eventual aumento da inflação dos Estados Unidos, acima da meta de 2%, e a consequente elevação da taxa de juros, além de intensificação das disputas comerciais e incertezas sobre o Brexit. "Se esses riscos se materializam, os mercados financeiros poderiam reagir bruscamente, como fizeram em dezembro de 2018; o volume de capital que flui para América Latina e Caribe provavelmente seria reduzido ainda mais e o custo aumentaria."

De acordo com o estudo, a situação mundial traz à região a necessidade de encontrar meios que estimulem a expansão. Nesse sentido, o organismo elencou as principais lacunas e oportunidades para estimular esse incremento. "Um investimento adicional em infraestrutura poderia impulsionar significativamente o crescimento na região", destaca o BID.

Advertências a Brasil, México e Colômbia

Nas análises complementares, o BID destacou os principais gaps de todas as nações latinas e caribenhas, trazendo também análises setoriais e recomendações para destravar os investimentos privados, essenciais em um momento em que os Estados passam por ajustes fiscais.

Para a entidade multilateral, o setor de infraestrutura brasileiro enfrenta problemas sistêmicos, que incluem "um deficiente planejamento de longo prazo, a necessidade de uma visão estratégica integrada e melhoria nas orientações e triagem de projetos para dar suporte à construção de um pipeline qualitativo". Também são apontados os riscos regulatórios, a necessidade de melhorias em licenciamento ambiental, as limitadas opções de financiamento de longo prazo e a falta de incentivos.

Para o grupo de trabalho do BID, o País tem como desafio a alavancagem de sua infraestrutura, principalmente no segmento dos transportes, "fundamental para melhorar as perspectivas de crescimento e produtividade do Brasil".

Já o México apresenta um nível de investimento baixo, representando metade da média da América Latina e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE). Em 2016, esse país "investiu aproximadamente US$ 22,8 bilhões (2,1% do PIB) em infraestrutura (Infralatam, 2017). Mais de 80% desses investimentos foram feitos pelo setor público. Os investimentos concentraram-se nos setores de energia (1,5% do PIB) e transportes (0,5% do PIB)".

A entidade direciona ainda o ponto de atenção a políticas e intervenções a considerar, visto que o presidente Andrés Manuel López Obrador ainda não conta com uma carteira robusta para o país. "O novo governo tomou posse em 1º de dezembro de 2018, de modo que todas as mudanças a serem implementadas a partir de 2019 nos diversos setores ainda estão em fase de planejamento. Até o momento, o Trem Maia e o Corredor Transoceânico são os únicos projetos sugeridos para o período de seis anos de 2019-2024 no setor de transporte."

Reconhecendo a estabilidade econômica e a consolidação de um marco de políticas, na Colômbia o cenário é mais positivo. A nação andina é considerada "um ambiente receptivo ao investimento privado", avanço possível a partir de melhorias em segurança pública. "Durante os últimos anos, o investimento total em infraestrutura cresceu de maneira considerável, atingindo 6,5% em proporção ao PIB em 2015. Desse aporte, mais de 63% vieram da iniciativa privada (4,1% do PIB) e se concentraram, principalmente, no setor de transportes."

Hoje, cabe à Colômbia aumentar a produtividade para atingir uma trajetória de crescimento sustentável e, nesse sentido, a área de infraestrutura adquire especial relevância.

Realidade do setor de transportes

Enquanto no Brasil a malha rodoviária é considerada pequena relativamente à extensão do território, e o País se mostra fortemente dependente desse modal, o México é alertado sobre as emissões de CO2, 18% a mais do que a média de países com renda per capita similar. Já a Colômbia enfrenta insuficiente dotação e baixa qualidade da infraestrutura viária, uma brecha relativa a -52,5% em relação a países com ingressos semelhantes.

Com uma das maiores redes rodoviárias do mundo em termos absolutos, de aproximadamente 2 milhões de quilômetros, o Brasil tem apenas 12,3% da rede pavimentados e 28% em más condições, recorda o report.

Outros pontos ressaltados pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento são o alto custo operacional da rede pavimentada e o impacto ambiental negativo, além das altas taxas de acidentes rodoviários. "A forte dependência do Brasil dos caminhões também aumenta o custo do transporte de cargas." Ao mesmo tempo, "a malha ferroviária é limitada e sofre com gargalos operacionais. Equipamentos obsoletos, terminais multimodais limitados e déficits de capacidade reduzem a eficiência do sistema portuário do País."

A vasta existência de rios e a falta de desenvolvimento do segmento aquaviário, com instalações precárias, e as limitações operacionais de alguns aeroportos também foram considerados.

Por sua vez, o México é afetado por uma percepção desfavorável à qualidade de seus modais. "Além disso, os aeroportos têm grandes áreas de oportunidade para melhorias, bem como importantes deficiências de infraestrutura. A política marítima concentra-se no comércio externo, favorecendo o desenvolvimento de portos de águas profundas, negligenciando o tráfego marítimo de cabotagem, que envolve o mercado interno."

No caso da Colômbia, a vulnerabilidade diante de fatores climáticos, o baixo investimento público e a precária conectividade entre as cidades devem ser superados. "A prestação dos serviços de transporte de carga apresenta outras ineficiências, como um parque automotor antigo e altamente informal, e tarifas que aumentam o custo médio do serviço. Isso se manifesta em brechas negativas de -19,7% no desempenho logístico e -26,8% no indicador alfandegário.

Gaps em energia

Outro setor abordado pelo BID é o elétrico. Brasil e Colômbia devem diversificar sua matriz energética. O México, por sua vez, precisa combater uma lacuna negativa, ocasionada por perdas na distribuição e na transmissão e também por conta da qualidade da energia como insumo produtivo, o que gera maiores custos de negócios.

"A matriz energética do Brasil é altamente dependente da energia hidrelétrica, uma fonte de energia limpa e de baixo custo, mas vulnerável à mudança climática. Idealmente, a capacidade de geração adicional deve vir em grande parte de fontes renováveis,  como sistemas eólicos e solares", diz o relatório.

Entre os destaques, está a energia eólica, com potencial para gerar até 350 gigawatts, mais do que o dobro da geração total de energia do País em 2015. "A energia solar também oferece um potencial considerável, já que a irradiação anual no Brasil varia entre 1.200 e 2.400 quilowatts-hora por metro quadrado. Em particular, a região Nordeste tem um potencial solar significativo, e sua alavancagem poderia promover o crescimento e a geração de renda em áreas menos desenvolvidas."

Já em território mexicano, "cerca de 34% dos domicílios ainda usam lenha como fonte de energia, principalmente no setor rural. Os hidrocarbonetos representam 90% da produção de energia de fonte primária – petróleo, condensados e gás liquefeito – enquanto os restantes 10% provêm da energia nuclear e de fontes renováveis."

Por sua vez, na Colômbia, o banco adverte sobre a dependência das gerações hidráulica (69,6%) e térmica (29,4%), enquanto fontes não convencionais de energia renovável representam menos de 0,7% do total. "Assim, em períodos de seca prolongada, as fontes térmicas devem cobrir uma alta porcentagem de geração, o que aumenta o custo. Portanto, a sustentabilidade do sistema energético é a dimensão com mais adversidade, o que se reflete em um gap negativo de -7,7%."

Tratamento de água e saneamento

No segmento de água e de saneamento, a perspectiva para México e Colômbia é mais otimista em relação ao desempenho e aos serviços oferecidos à população. Por outro lado, "o Brasil confronta deficiências significativas no saneamento".

"Quarenta e três por cento da população urbana do Brasil têm acesso à coleta e ao tratamento de esgoto, e 12% usam um sistema autônomo. Dezoito por cento têm seu esgoto coletado, mas não tratado, e 27% não recebem serviço de esgoto sanitário. O setor de saneamento sofre com problemas significativos de governança e incerteza regulatória", reporta o BID.

No México, embora o panorama seja mais positivo, segundo a análise da instituição, "também existem lacunas negativas nesse setor relacionadas ao acesso da população rural e urbana aos serviços de saneamento".

"Em termos de cobertura, em 2015, apenas 67% da população recebiam água encanada todos os dias e 63% tinham acesso a água encanada diariamente por meio de drenagem ligada à rede de esgoto sanitário ou fossa séptica. Outros problemas incluem o faturamento de apenas 50% da produção, o que afeta a eficiência dos prestadores de serviços. Há também deficiências no tratamento de águas residuais [dados do Conagua 2017] e 29% dos locais de monitoramento registram a qualidade da água com algum grau de poluição orgânica."

Na Colômbia, a sustentabilidade dos serviços requer repensar a organização atual no nível territorial e revisar os esquemas tarifários e os subsídios. "É necessário melhorar os indicadores de eficiência operacional e comercial das operadoras para aumentar seus fluxos de caixa e com isso sua capacidade de assumir os investimentos requeridos pelos sistemas, facilitando o acesso direto das empresas ao mercado de capitais e ao mercado de crédito. Com essas políticas estratégicas, igualmente é preciso avaliar e atualizar o esquema de subsídios no setor, a fim de alcançar um direcionamento adequado para eles."

Principais recomendações do BID

Ao final de cada uma das análises, a instituição traz ainda sugestões para superar as lacunas nos diversos segmentos. Além dos citados acima, foi analisado também o de telecomunicações.

Investir em multimodais, mobilidade urbana e sistemas que permitam a redução de custos logísticos são algumas das orientações para a área de transportes. À Colômbia, especificamente, o BID pontua que seria necessária a instalação de 45.000 quilômetros de rede viária adicional.

No que diz respeito à energia, ampliar a presença de fontes renováveis é uma constante do relatório. Para os colombianos, há a proposição de redução do valores de auxílio repassados pelo Estado, destinando-os exclusivamente à população de menores ingressos. Já os mexicanos devem manter integrados todos os âmbitos administrativos – federal, estadual e municipal –, insta o documento.

"O México enfrenta atualmente o grande desafio de ativar o uso de energia renovável; consequentemente, políticas precisam ser implementadas para promover o uso desse tipo de energia nos setores agrícola e residencial, por meio de medidas como subsídios às tarifas de energia elétrica", continua o documento.

A necessidade de ajustes regulatórios também é apontada para os brasileiros. "As ações políticas recomendadas incluem a adaptação do marco regulatório para um sistema de geração distribuída (GD) e o apoio à inovação para aumentar a competitividade nos segmentos de energia eólica e solar".
 

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