Seguradoras iniciam movimento de correção de taxas para construção

Rating dos segurados se torna um diferencial diante dos problemas com insumos

7 de maio de 2021Mercado Imobiliário

Em decorrência da Covid-19, a construção civil vem enfrentando problemas de desabastecimento, aumento no preço de insumos e, em alguns casos, paralisação de obras. Nesse contexto, especialistas sinalizam uma consequente alta nas taxas dos seguros de obras, assim como uma avaliação mais criteriosa dos segurados.

De acordo com Roberto Paiva, diretor-executivo da HTB Engenharia e Construções, as adversidades citadas têm prejudicado o cumprimento dos cronogramas de obras: "Muitas vezes, compramos o material, acordamos determinado prazo, mas ele não é efetuado. Obviamente, tem impacto direto no andamento da construção".

Neste caso, Hernani Varella, proprietário da Tallento Engenharia, alerta para outro empecilho: "Além de atrasar a entrega da obra, problemas com o cronograma aumentam a incidência das despesas indiretas, o que significa mais problemas relacionados aos custos". 

As despesas indiretas listadas pelo índice BDI na Construção Civil (Budget Difference Income, em inglês) são a instalação do canteiro de obras, custos com a administração local, aluguel da sede da empresa, mobilização e desmobilização do canteiro, despesas tributárias e os próprios seguros. 


Thiago Lang, diretor da Aon, explica que dois fatores importantes envolvem os seguros: a experiência da obra em si e o cronograma físico-financeiro. O primeiro aspecto apresentou queda da sinistralidade de 59% para 53% entre 2019 e 2020: "A redução no volume de obras ativas faz com que haja menor risco de acidente no canteiro", diz o executivo.

Já no aspecto físico-financeiro, foi verificado o alongamento de prazos e a inflação do preço das obras. Até então, a maioria das situações tem sido resolvidas através de renegociações de prazos e, em alguns casos, valores, evitando a execução da garantia propriamente dita.

De qualquer maneira, Lang admite que já se iniciou um movimento na atividade seguradora de correção nas taxas para a construção civil. Entretanto, o diretor faz uma ressalva: "Os acréscimos não serão na mesma proporção do aumento de custo de materiais". 

Detlef Dralle, diretor-presidente da HTB, considera o cenário factível. "Ainda não sentimos o efeito, mas pela lógica, haverá a revisão de taxas nos seguros de performance. Na época em que muitas empresas do mercado de infraestrutura quebraram, o preço dos seguros aumentou muito em função dos prejuízos que foram auferidos e das indenizações que foram pagas. De alguma forma, o mercado segurador precisa se reerguer e deverá ser por meio do aumento de prêmios", afirma.

Para o executivo, aliás, o fato de ainda não ter experimentado o aumento no preço dos seguros pode estar relacionado ao rating da companhia. "É um dos melhores do Brasil porque temos praticamente zero incidências", acrescenta.

Também com bons desempenhos, Varella confirma esta particularidade. "O valor do seguro de obra está lastreado no critério de avaliação dos segurados. Funciona como o seguro de um carro: para o motorista que dificilmente bate o carro, a taxa é menor do que para aquele que bate o carro todo ano". 

Desse modo, o proprietário da Tallento conclui que, para as construtoras com poucos problemas de atraso e aumento de preço, ainda não houve correção nos seguros. Já para as construtoras novas no mercado, ou aquelas que tiveram muitas dificuldades, isso começa a ser realidade. "O fato é que as seguradoras estão mais seletivas", avalia.

Medidas para evitar sinistros

Para se manterem bem avaliadas pelas seguradoras, assim como garantir a saúde financeira dos projetos, as duas empresas têm adotado medidas para minimizar os efeitos da pandemia nos canteiros de obras. A HTB, por exemplo, está procurando antecipar as compras de materiais e as contratações dos serviços.

"Requer um grande desembolso de caixa, que não estava previsto dentro do orçamento, mas protege o negócio das altas no preço de materiais e serviços e dos problemas com os prazos de entrega", diz Paiva.

"Nos últimos anos, o just in time, modelo no qual se gasta quando realmente é preciso, tornou-se uma referência. Contudo, essa situação nos fez voltar uns 30 ou 40 anos em teoria de eficiência. Agora, a estratégia é comprar todos os suprimentos no início, armazenar no estoque virtual e evitar sofrer aumentos de preço", complementa Dralle.

A Tallento, entre outras medidas, tem tentado reduzir custos ainda na fase de projeto. Para isso, utiliza um banco de dados que contém informações das quase 1.200 obras que a empresa já participou, comparando a eficiência de cada uma delas nos mais variados quesitos.

"Usamos indicadores para nos reunirmos com os projetistas parceiros e buscarmos soluções mais econômicas. Por exemplo, em nossas obras residenciais, a espessura média de concreto [quantidade de concreto utilizado dividido pela área da obra] é de 24 centímetros. Caso chegue um projeto com 26 cm ou 27 cm neste aspecto, estudamos como é possível alcançar os 24 cm de média", explica.

"Se tivéssemos uma espessura 10% maior, estaríamos aumentando este custo na mesma proporção. Como a estrutura, juntamente com a fundação, representa 20% do custo de obra, este aumentaria em cerca de 2%. Esta estratégia permite manter o orçamento da obra dentro do padrão histórico", completa.

Em paralelo, Lang enaltece que é importante que o segurado declare para a seguradora qualquer impacto ocorrido sobre os valores em risco na obra. "Caso contrário, a construtora pode ter um valor de seguro abaixo do que realmente deveria", esclarece.

Por fim, o diretor da Aon cita que a pandemia, por ser um acontecimento inesperado, fomentou o mercado segurador. "Quando falamos de seguros, falamos de risco. Foi um evento totalmente imprevisto de impacto gigantesco, que mostrou como pessoas e negócios são vulneráveis às adversidades externas".


Por Daniel Caravetti