Mercado imobiliário argentino nutre expectativa de evolução

Entre fatores que influenciam expectativas favoráveis, estão novos créditos hipotecários e política de regularização de capitais

17 de maio de 2018Mercado Imobiliário

Foram anos de uma forte crise que atingiu todos os setores da economia. Pouco a pouco, as circunstâncias melhoraram e os players imobiliários que atuam na Argentina foram se mostrando mais confiantes em perspectivas futuras positivas.

Em março e abril, GRI Club ouviu 340 empresários e executivos que operam ou investem na América Latina – sendo 50 deles especificamente na Argentina – para o Termômetro do GRI e apurou que, conforme 78,38%, os resultados de suas companhias nos próximos 12 meses devem ser bons ou excelentes. A maioria (73,68%) também indicou que suas empresas estão investindo e/ou ampliando negócios localmente. O humor positivo com esse mercado foi semelhantemente notado durante o Latin America GRI 2018 – pouco antes de novos solavancos no país.

Entre os fatores que influenciam expectativas favoráveis, estão políticas recentes promovidas pelo governo de Mauricio Macri, como os novos créditos hipotecários e a regularização de capitais, conhecida como blanqueo de capitales. Além disso, o presidente demonstrou capacidade de articulação política, fundamental para novos avanços.

“Macri ganhou [as eleições legislativas do último ano] e é muito provável que seja reeleito”, prevê Domingo Speranza, presidente da Newmark Grubb Bacre, que moderou discussão sobre o mercado argentino no evento do GRI.

Onda turbulenta

Nem as turbulências observadas a partir do início de maio – com forte elevação dos juros, desvalorização da moeda e anúncio de que o País recorreria ao Fundo Monetário Internacional (FMI) – parecem ter derrubado os ânimos dos executivos do setor. “Com uma visão de médio prazo, não vejo nenhuma mudança substancial ou deterioração das condições”, aponta Issel Kiperszmid, presidente da Dypsa International.

Segundo ele, tais ajustes eram necessários e foi preciso uma ação imediata por parte do governo. “Apesar [desse contexto], mantenho o otimismo, talvez com um pouco de cautela, mas continuamos com boas perspectivas para o ramo imobiliário, muito por conta da agenda político-econômica [já implementada ou em andamento]", complementa.

“Confiamos que essa situação será controlada pela atual administração, que tem uma equipe econômica bem qualificada e com experiência frente a esse tipo de crise financeira. Nossos planos de investimento futuro não devem ser alterados”, pontua Diego Chevallier Boutell, CEO do ARG Realty Group, que recebeu um aporte de USD 300 milhões de Equity International, Goldman Sachs, Centaurus Capital e Grupo Pegasus no último mês de abril.

Diego também reconhece que este é um momento de prudência para a tomada de decisões, “em especial por conta da volatilidade cambial, que deverá continuar por mais algum tempo”; porém, reforça que as perspectivas em relação ao futuro se mantêm positivas.

O fenômeno dos créditos UVA

A primeira novidade do atual governo a gerar impactos na indústria de real estate foi o sistema de indexação por Unidade de Valor Aquisitivo (UVA), ou seja, pela inflação, inspirado no modelo chileno e que tem transformado a realidade do setor desde o seu lançamento, em abril de 2016. De acordo com o Banco Central da República Argentina (BCRA), 2017 terminou com um recorde histórico de empréstimos indexados pela UVA para a compra de casas, num total de 118 bilhões de pesos argentinos (o equivalente a R$ 19,5 bilhões), 99,1% acima do registrado no ano anterior.

“Previamente, não havia crédito. Esses começaram a aparecer há um ano e meio e tornaram-se um boom. Mês a mês, a expansão é fenomenal. No último ano, o segmento de construção cresceu 16,5% e temos certeza de que estamos iniciando um ciclo positivo”, explica Issel.

Graças à UVA, “estão ocorrendo mudanças importantes. Acredito que teremos uma revolução por conta do déficit habitacional”, opina, por sua vez, Eduardo Bastitta Harriet, CEO da Plaza Logística.

Atualmente, segundo o Instituto da Habitação da Província de Buenos Aires, 12,2 milhões de argentinos não dispõem de moradia adequada.

Outros progressos

Anunciada há dois anos, a lei 27.260/2016, que regulamentou a regularização de patrimônio não declarado de contribuintes tanto no exterior como no próprio país, também promete render bons frutos. A Casa Rosada confirmou que, em 2017, impulsionado pela legislação, um valor de US$ 116,8 bilhões foi declarado. Cerca de 80% desse montante, portanto mais de US$ 93 bilhões, estavam em outros países, e US$ 23,5 bilhões, ou seja, um quarto dessa fatia, foram repatriados durante o ano.

“O interessante é que os valores branqueados [regularizados] ainda não foram investidos, mas em algum momento vão ingressar [na economia]”, analisa o líder da Dypsa International.

A nova Lei de Financiamento Produtivo que, entre outros aspectos, regulamenta o mercado de capitais, também é considerada um avanço para o setor imobiliário. “A reforma do mercado de capitais será positiva e há um horizonte de [decorrente] crescimento econômico, mesmo que modesto”, aponta Eduardo.

A norma, promulgada no início de maio, institui os REITs (Real Estate Investment Trusts), isto é, fundos de investimento imobiliário. Embora sejam comuns e bem-sucedidos em outras partes do mundo, ainda não são reconhecidos na Argentina. “Estamos trabalhando nessa frente com a criação de um fundo dessa natureza”, revela o líder da Dypsa. Ele celebrou a aprovação, que considera “necessária para o desenvolvimento desse mercado, até então inexistente”.

Chegada de grandes players

Os entrevistados pela GRI Magazine também se mostram otimistas em relação ao aumento da atenção estrangeira para com a Argentina. “Se antes [os investidores internacionais] estavam bastante cautelosos, hoje, vemos o despertar de maior interesse”, ressalta Issel Kiperszmid.

Ele cita como exemplos as chegadas do bilionário Jorge Perez, presidente do Related Group, que tem anunciado investimentos locais desde 2016, e de Sam Zell, da Equity International. “É um processo que já começou e seguramente virão outros. O governo está favorecendo isso”, pontua.

Consolidação e investimento institucional

“A Argentina precisa muito de aportes externos, mas de longo prazo, e, para isso, necessita criar as condições, o que já está fazendo, com um novo marco impositivo [a reforma tributária aprovada no final de 2017], um novo marco legal [recente medida aprovada pelo Congresso], uma inflação controlada e um crescimento sustentável”, sustenta Diego Chevallier.

Ele explica que a injeção de valores no ARG Realty Group contempla novos projetos e incluirá também investimentos em ativos existentes, como o shopping TOM (Tortugas Open Mall). "Por isso, vemos o futuro com boas perspectivas e estaremos muito atentos em busca de oportunidades.”

“É válido ressaltar que o mercado argentino não tinha presença institucional, como há em outros países. No Brasil, por exemplo, o processo de abertura a investidores, desenvolvendo escritórios e ativos de renda, começou há 20 anos”, compara Diego. “Hoje, o Brasil tem um mercado desenvolvido, com grandes investidores. Não passamos por isso. Há alguns players locais. Entretanto, a institucionalização não se desenvolveu. Acredito que iremos principiar esse movimento agora”, adiciona.

O setor industrial tem sido objeto do interesse desse novo tipo de player (internacional e também institucional) e vê seu volume de investimentos gradualmente ser engrossado. “Neste momento, existem 300 mil m² em obras, algo único no país”, conta Eduardo, da Plaza Logística. Outros ramos também observam dinâmica ascendente.

O resultado consolidado do Termômetro do GRI mapeou que os segmentos imobiliários mais atrativos para investimento hoje na Argentina, considerando os diversos tipos de agentes do mercado, são residencial, hotéis e shopping centers.

Fator tecnologia

Nesse caldeirão de oportunidades e desafios, há ainda mais um ponto a melhorar para garantir o progresso do mercado imobiliário argentino. “Existe muito para por fazer em redução de custos. Se, por um lado, o governo está trabalhando na diminuição de [impostos sobre] insumos, por outro, é preciso incorporar tecnologia à construção. Essa é uma grande ocasião porque [as novas reformas] nos permitem trazer equipamentos de última geração", advoga o presidente da Dypsa International. A companhia está implementando atualmente um plano de minimização de até 24% dos custos.

A Plaza Logística também se mostra atenta à evolução tecnológica; porém, fundamentalmente como elemento gerador de negócios, sobretudo vinculados ao comércio online. “Estamos com várias obras em andamento, destinadas às novas logísticas, como os e-commerces, que representam os novos setores da economia e afetam fortemente a criação de empregos e o PIB”, diz Eduardo.

 

Esse e outros conteúdos você encontra na GRI Magazine Real Estate 14ª edição.