Imagem de capaGuilherme Machado, fundador e CEO do Instituto Quebre As Regras<br />Crédito: GRI Club/ Flavio Guarnieri

Guilherme Machado: setor imobiliário deve criar significado

Fundador do Instituto Quebre as Regras diz que desafio do mercado hoje é estabelecer identidade e se voltar a tribos.

30 de setembro de 2019Mercado Imobiliário
 Significado, identidade e senso de pertencimento a uma tribo. Essas são algumas das expressões mais usadas por Guilherme Machado, fundador e CEO do Instituto Quebre As Regras, para definir os grandes desafios do mercado imobiliário na atualidade, diante de mudanças significativas de comportamento do consumidor. "As pessoas querem pertencer a algo muito maior", lembra ele, que falou ao GRI Hub durante sua participação no GRI Loteamentos 2019. Acompanhe a entrevista: 


Ainda poucas empresas do setor imobiliário apostam em estratégias fortes de branding e em vincular os nomes dos empreendimentos diretamente às suas marcas. Que caminho você enxerga para o futuro?
Exemplos como o da Alphaville Urbanismo e o da Vitacon já mostram a movimentação e a aceitação do mercado em caminhar para esse lado. O que não dá mais é para ter prédios iguais que não falam com a cidade nem com a comunidade. O indivíduo vive isolado em arranha-céus que não se comunicam com ele. Então, o desafio do mercado hoje é entender esse comportamento social e criar marcas, identidades e significados. Não importa o preço nem a distância; se houver significado, a pessoa vai porque sua tribo está lá. A questão não é desenvolver cidades inteligentes. Isso é o mínimo, é obrigação, é o óbvio. As pessoas precisam se conectar a significados, a outras pessoas, se relacionar e construir a sociedade de forma conjunta – isso sim é o mais importante.

Nessa perspectiva, cada companhia vai acabar se voltando a uma única tribo?
Acredito muito na multiplicidade por conta das conexões. Vejo muita convergência de algumas empresas para atender a comunidade, que é grande e precisa de elasticidade. Não se vai ter uma construtora ou uma loteadora para atender a todos. Vai haver tribos de construtoras atendendo a essa sociedade.

A economia e o setor imobiliário no País vêm de anos difíceis, situação que ainda não se reverteu por completo. Como incentivar decisões de compra de longo prazo – caso das imobiliárias – num cenário como o atual, que se mostra promissor, mas ainda cercado de incertezas? 
Veja a crise que tivemos em 2013 e 2014. Parou-se de comprar imóveis? Não. Apenas houve diminuição. O que temos que entender é que, hoje, a relação comercial com nossos clientes, entre marca e cliente, não mais é uma relação de produto, mas de confiança. A pergunta não é se seu produto é bom, e sim se seu cliente confia em você. Neste novo momento que vivemos, que parece de euforia e retomada de confiança do mercado, as pessoas [líderes empresariais] começam a se movimentar, mas será que estão preparadas? Aprenderam com os erros do passado? Isso me preocupa muito.

Tema a repetição do antigo ciclo?
Esse é o problema. Vejo hoje um ciclo vicioso de uma sociedade em que os empreendedores ainda insistem em fazer o que fizeram no passado – e, pior, querendo aproveitar esse novo
ciclo econômico para recuperar os prejuízos do passado. Isso não funciona. A questão é ajudar o outro a resolver o problema dele, se preocupar com a sociedade. Quem melhor compreender a comunidade é quem vai entrar numa crescente, pois a nova economia não é de produto, e sim de gente. 

Acredita que o período de baixa pelo qual a economia e o setor passaram acabou não sendo bem aproveitado para essa reflexão?
Acho que, no momento da crise, foi; porém, hoje parece que as pessoas esqueceram. A memória é muito curta. O paradigma está estabelecido. O grande ponto é que ninguém aproveitou a crise para organizar sua casa. A maior parte das empresas ainda está desorganizada de forma interna. É preciso mudar de dentro para fora. Se as pessoas mudarem, a empresa muda, o cliente muda, a sociedade muda e as conexões se tornam sadias porque são genuínas, íntegras, verdadeiras. Empresas foram feitas para dar lucro – não discuto isso. Entretanto, discuto o meio de dar lucro e, nessa nova economia, isso acontece quando se ajuda as pessoas a resolverem seus problemas, não os das companhias.

Em que aspectos a
tecnologia será, nos próximos meses e anos, fundamental para otimizar os processos de marketing e vendas empreendimentos imobiliários? E em que parte a interação humana continuará imprescindível? 
O que a máquina vai substituir? Tudo o que é operacional. Tudo o que pode ser repetido, a máquina vem e faz melhor. Onde o ser humano entra? Exatamente na humanização. As pessoas precisam ser interessantes e não interesseiras. Se preocupe com as pessoas, seja interessante. Estamos vivendo hoje como zumbis. A grande questão é compreender todas essas mudanças pelo olhar do outro para conseguir levar a ele o que deseja. Trata-se de uma ruptura muito grande. É difícil falar a um empresário para que diminua seus lotes, mas aumente a área de socialização e crie um centro cultural. Isso não é rentável, mas é social, pois, no próximo [empreendimento], sua tribo vem junto. Muitas vezes, um loteador lança um empreendimento, o entrega e nunca mais volta. Não participa daquela sociedade que ajudou a construir. Então, não há identidade, personalidade, significado. Precisamos entender que a vida é sobre transformação humana, legado.

Na sua visão, qual o principal impacto do advento e da expansão dos marketplaces para os negócios imobiliários? E do modelo
iBuyer especificamente?
O iBuyer ainda é um desafio, mas acredito bastante nele e também em novas formatações de moradias. Há muitas perguntas [em curso] porque o ser humano está mudando seus comportamentos numa velocidade muito rápida. De todo modo, creio que, se quisermos saber qual deve ser a grande aposta para os próximos anos, o caminho será encontrar nossa tribo e nos preocupar com ela. Deixe para lá quem não faz parte dela, quem não gosta de você. As pessoas querem pertencer a algo muito maior. Nosso papel é dar a elas pincel e tinta, e deixar que pintem. Elas sabem o que é melhor para elas.

Como foi participar do GRI Loteamentos Brazil 2019?
Muito bom, até pelo próprio público e pelo desafio. São pessoas intelectualmente críticas, às quais não se pode trazer mais do mesmo. São pessoas de sucesso, e questionar o sucesso é muito difícil. 

Entrevista concedida à editora-chefe, Giovanna Carnio


Brazil GRI 2019

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A evolução da sociedade e novos modelos de negócios, novidades do marketing imobiliário em busca de maior assertividade, e o futuro da venda no mercado de real estate em um mundo cada vez mais tecnológico são alguns dos temas que estarão em discussão no Brazil GRI 2019. O evento, que celebra dez anos, acontece em novembro em São Paulo.
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