Fábio Araújo, sócio da Brain, projeta recordes no mercado residencial em 2021

No ano passado, vendas de apartamentos cresceram entre 5% e 10%, segundo prévia dos indicadores nacionais

11 de fevereiro de 2021Mercado Imobiliário
O mercado imobiliário residencial brasileiro tem boas chances de bater recordes de lançamentos e vendas em 2021, tanto nos empreendimentos verticais quanto nos loteamentos, segundo afirma Fábio Araújo, sócio-diretor da Brain Inteligência Estratégica. Além das projeções para o ano, o GRI Club também obteve com exclusividade prévias dos indicadores imobiliários nacionais que serão apresentados no próximo dia 22, referentes a 2020.

Afetados pelo cenário de incertezas diante da chegada da covid-19 ao Brasil, os lançamentos residenciais verticais caíram entre 20% e 25%. Mesmo assim, contrariando todas as expectativas iniciais, as vendas de novos apartamentos cresceram de 5% a 10% ante 2019, o que representa o melhor resultado desde que a Brain começou a realizar os indicadores nacionais em parceria com Senai e CBIC.

Segundo Araújo, o movimento de alta - que até pode ser chamado de boom, considerando as projeções feitas em março do ano passado - se deve a uma combinação de taxas de juros mais baixas nos financiamentos imobiliários, queda na rentabilidade de aplicações financeiras e manutenção da renda nas famílias que mantiveram os empregos durante a pandemia.

Com menos lançamentos e mais vendas, o estoque de apartamentos chegou ao menor nível no fim do ano passado, próximo a nove meses para escoamento (considerando o ritmo de vendas dos últimos doze meses e que não haveria qualquer novo lançamento). 

Os resultados do mercado horizontal foram menos expressivos, com uma queda maior nos lançamentos - de 35% a 40% - e redução também no volume de vendas - de 10% a 15%. Por outro lado, a demanda por empreendimentos prontos, isto é, nos quais o adquirente do lote já podia construir, explodiu, segundo Araújo, resultando no “derretimento” do estoque disponível. 

Em que pese a significativa alta nos custos da construção nos últimos meses, bem como o provável aumento da Selic para algo entre 3% e 4%, o sócio da Brain aponta como principais pontos de atenção em 2021 as contaminações por covid-19 e o fim do pagamentos do auxílio emergencial, que podem afetar a demanda.

Por outro lado, embora não sejam primordiais para o desempenho do mercado residencial, os avanços esperados no ambiente político, assim como a transformação digital das empresas, podem ajudar na retomada. 

Segundo Araújo, é seguro imaginar um crescimento de dois dígitos em lançamentos e vendas de novos apartamentos. Já no mercado horizontal, espera-se uma avalanche de novos projetos - muitos dos quais foram represados em 2020 - e aumento expressivo nas vendas, também, como já se pôde notar em janeiro.

Confira a seguir mais trechos da entrevista.

GRI Club: O que explica essa alta inesperada nas vendas de apartamentos, considerando que no início da pandemia todos pensavam que não só os lançamentos iam recuar, como as vendas também?

Fábio Araújo: Primeiro que esse resultado até pode ser classificado como boom, pois desde que começamos a pesquisar nacionalmente os indicadores, no final de 2015, é o maior volume anual de vendas [de apartamentos novos], sendo que a velocidade de comercialização de lançamentos é sempre três ou quatro vezes maior que a de estoque. Se há menos unidades lançadas, em tese, haveria queda de vendas, mas houve aumento. O que aconteceu entre agosto e dezembro é algo simplesmente extraordinário.

O primeiro motivo é de ordem financeira, que são as baixas taxas de juros não apenas nos financiamentos, mas também uma queda do custo de oportunidade de tirar o dinheiro da poupança e usá-lo para fazer um upgrade. E o segundo é um aspecto subjetivo e psicológico de pessoas querendo melhorar de vida na medida em que ficaram presas em casa. 

A questão das vendas subirem mesmo com a queda nos lançamentos indica que foi vendido muito estoque, correto?

Sem dúvida. Nós terminamos o ano com o menor volume de estoque da história dos indicadores imobiliários nacionais. Para se ter uma ideia, no pior período dos distratos, lá em 2016, demorava mais ou menos 25 meses para zerar o estoque na velocidade de vendas daquele período. 

Terminamos dezembro de 2019 com o menor prazo para escoamento (10,5 meses), e as prévias do ano passado (resultados até novembro) indicam que devemos ter encerrado 2020 ao redor de 8,5 meses. Ou seja, se ninguém lançar nada a partir de agora, em menos de 9 meses não terá apartamento na planta, novo (mesmo que pronto) para vender no Brasil. Então isso é um consumo brutal de estoque por essa queda de lançamentos com as vendas se mantendo em um patamar elevado.

Falando sobre os tipos de produto residencial, essa performance de queda nos lançamentos, alta nas vendas e consequentemente uma redução do estoque foi equânime entre baixa e alta renda?

Teve diferença. O grande destaque são os imóveis de alto padrão. O mercado de produto de entrada, imóvel econômico, foi do mesmo tamanho porque não tinha como crescer, precisaria mudar a política pública, o FGTS já está na utilização máxima e o volume foi muito parecido [com o de 2019] para o Minha Casa Minha Vida e a Casa Verde e Amarela.

A nossa estimativa é que o mercado de alto padrão cresceu mais de 60% nas vendas no ano passado. Estamos fazendo um estudo específico sobre isso atualmente e as prévias indicam que o volume comercializado aumentou entre 60% e 80% em relação a 2019.

O que explica isso? Aqueles dois fatores que eu falei: baixa taxa de juros e busca por mais bem estar. A pessoa tem mais dinheiro guardado, não tem ganhos com as aplicações e passa a buscar maior qualidade de vida diante de limitações que outras camadas da sociedade já viviam e ela, não. Isso estimulou a busca por melhorar a qualidade de vida.

Quais regiões mais se destacaram e quais não performaram tão bem no ano passado?

Todas as regiões cresceram. A que cresceu menos, proporcionalmente, foi São Paulo, mas isso é porque já estava em um patamar muito alto - foi o grande destaque de 2019 e não tinha como crescer mais. Eu acho que as outras regiões recuperaram participação e São Paulo ficou mais ou menos do mesmo tamanho.

Ainda sobre incorporação vertical, quais são as projeções para 2021, já considerando o contexto de vacinas chegando ao país, mas, por outro lado, uma tendência dos juros subirem um pouco? 

Se não houver uma nova onda realmente forte de covid-19, a nossa avaliação é que será um ano de recordes em lançamentos e vendas. Acho que precisamos caminhar mais uns 40 dias para ter uma noção dos valores (percentual, quantidade de unidades); estamos fazendo uma pesquisa em relação a isso, inclusive. Não consigo colocar em porcentagem, mas acredito que será recorde em ambos. É seguro imaginar um crescimento de dois dígitos.

Qual é o panorama no mercado de loteamentos?

A nossa avaliação é que no mercado de loteamentos, por diferentes motivos, foi mais complicado lançar durante a pandemia do que no mercado de incorporação. Ele é mais pulverizado em cidades pequenas, as empresas utilizam menos tecnologia na gestão comercial e precisam vender muitas unidades num período muito curto. Esse conjunto de situações fez com que o receio e a postergação de lançamentos fossem mais longos do que no mercado vertical.

Mas com o menor volume de estoque da história, o que eu posso dizer, também, é que produto pronto (que não estava em obras) derreteu, liquidou; o que estava pronto para a pessoa começar a construção, desapareceu do mercado, em especial lotes de médio e alto padrão.

A expectativa para 2021 é de uma retomada forte dos lançamentos, até pelo baixo volume em 2020? Nas vendas também se espera um ano positivo?

Sem dúvida. Eu acredito que há grandes chances de haver recorde de lançamentos e vendas nos loteamentos. Vimos em janeiro, inclusive, alguns lançamentos derreterem. Como ficou represado por mais tempo, significa que tem muito mais espaço para lançar agora.

Algum fator externo que preocupa, tanto no mercado de incorporação vertical quanto nos loteamentos?

As únicas preocupações é o que vai acontecer com a covid-19 e quais serão os impactos com o fim do auxílio emergencial. A inflação preocupa no sentido em que cresceu, mas ainda se encontra dentro de padrões aceitáveis. Os juros devem subir para 3% ou 3,5%, ninguém diz que vai passar de 4%.

Além dos aspectos mencionados, há algum outro que seja positivo para o setor? A agenda política é importante?

Vejo que, da mesma maneira que o mercado no ano passado cresceu na esteira de uma mega recessão, queda do PIB próxima a 5% e com uma turbulência política, o setor vai responder menos a isso. Não significa que, se por acaso a agenda política for positiva, isso não seja um ingrediente a mais para ajudar, mas a verdade é que as pessoas vão continuar se casando, mudando de cidade, tendo filhos e se separando independentemente do que acontecer com tais reformas. 

A experiência comprova, ao longo de décadas, que na prática as coisas que impactam o mercado imobiliário são as que nós já falamos, a despeito desses aspectos mais estruturais, que são positivos, mas terciários para a decisão de alguém comprar um imóvel.

Por Henrique Cisman
 

GRI Residencial Brasil 2021