Entendimento do STF sobre cobranças de ITBI beneficia o mercado imobiliário

FIIs deixam de pagar o imposto na integralização de imóveis até o limite do capital social

11 de maio de 2021Mercado Imobiliário

Decisões recentes do Supremo Tribunal Federal (STF) em matéria de repercussão geral reacenderam discussões envolvendo o Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI). Desta vez, o parecer valida dois aspectos vantajosos aos contribuintes em geral, em especial empresas e fundos imobiliários.

O primeiro deles trata da não incidência do imposto municipal nos negócios imobiliários não levados a registro em cartório. Ou seja, o tributo pode ser cobrado apenas na efetiva transferência de propriedade, mas não em promessas de compra e venda e outras cessões de direitos aquisitivos, como acontece em grande parte dos municípios.

O outro benefício está relacionado com as operações de integralização do capital social. Desde sua criação, em 1988, a Constituição Federal prevê que a transmissão de imóveis incorporados ao patrimônio da pessoa jurídica em realização de capital está imune ao pagamento do ITBI.  

Entretanto, a regra não é válida para empresas que tenham como atividade preponderante a compra e venda ou locação de bens imóveis. Estas companhias sempre estiveram sujeitas ao pagamento do imposto na grande maioria dos municípios brasileiros. 

A jurisprudência do STF, pelo contrário, prevê a imunidade de ITBI nas transferências de imóveis dessas entidades até o valor dos imóveis que se destinam à integralização do capital social. Desse modo, somente os valores excedentes ficam sujeitos ao imposto municipal. 

"As prefeituras sempre procuraram cobrar integralmente o ITBI nessas hipóteses. Agora, há uma mudança de entendimento e eventuais legislações municipais que estabeleçam a cobrança do tributo passam a ser conflitantes com o parecer do STF e, portanto, podem ser questionadas em relação à sua inconstitucionalidade", afirma Vladimir Abreu, sócio do escritório TozziniFreire Advogados.

Vale lembrar que a análise de preponderância imobiliária para pagamento de ITBI permanece nas demais operações societárias: fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica. 

Reflexos no setor imobiliário

A imunidade de ITBI nas operações de integralização de capital social beneficia empresas e fundos dedicados às atividades imobiliárias. Manuela Aguiar, sócia da Blue Macaw, considera a deliberação positiva por duas razões, sendo a primeira delas a segurança jurídica.

"Dentre os investidores estrangeiros com os quais conversamos, muitos justificam a opção de não investir no Brasil por conta da insegurança jurídica. Independentemente do entendimento do STF, sempre que os tribunais superiores se debruçam sobre estes assuntos, especialmente em sede de repercussão geral, ocorre um aumento da segurança jurídica e, por consequência, o fomento da economia", diz.

Pensando no mérito das decisões, a executiva avalia que também há um ganho econômico em função da diminuição de custos nas operações de integralização de capital social e da possibilidade de aumentar o retorno para os investidores.

"O ITBI representa, em média, de 2,5% a 3% da maior quantia entre valor venal e o valor do negócio. Quando falamos de transações realizadas por FIIs [Fundos de Investimento Imobiliário], é uma parcela relevante", acrescenta Aguiar.

Bernardo Taier, vice-presidente da Brookfield Asset Management, também elogia a decisão: "Sem dúvida, existe um viés positivo. Esperamos que isso se materialize de forma prática, ou seja, no cotidiano do mercado". Farley Menezes, head of Legal da Autonomy Investimentos, celebra: "Do ponto de vista de custos, as operações poderão ser realizadas de forma mais eficiente".

De acordo com Aguiar, as integralizações de capital, previstas há muitos anos na legislação de fundos imobiliários, são mais comuns em fundos destinados a investidores qualificados e menos comuns em fundos amplamente negociados na Bolsa de Valores. 

Restituição de valores pagos

O entendimento do STF também abre margem para empresas e fundos imobiliários que tenham arcado com o imposto nos últimos cinco anos pleitearem a restituição dos valores pagos indevidamente, acrescidos de correção monetária e juros.

"Qualquer organização que tenha recebido capitalização via imóveis e pago o ITBI porque exercia atividade imobiliária nos últimos cinco anos tem a possibilidade de solicitar o que chamamos de repetição de indébito", explica Abreu.

Menezes afirma que, a princípio, não vislumbra casos de operações internas em que caiba pleitear valores pagos a título de ITBI. Pela insegurança que ainda envolve o tema, Taier garante ainda não ter uma posição definida frente a essa possibilidade.

"Permanecemos um pouco reticentes em relação a quais vão ser as consequências do entendimento do STF. Nos pouquíssimos casos em que participamos, eventualmente podemos vir a pleitear essa restituição, mas seguimos sem definição até o momento", revela Taier.

Segundo o sócio do TozziniFreire Advogados, uma vez que se tratam de decisões proferidas pelo STF com repercussão geral, os precedentes deverão ser observados pelas instâncias inferiores do Poder Judiciário. "Os juízes e tribunais têm que, obrigatoriamente, seguir a decisão do Supremo", assegura Abreu.

É baseada nisso que a advogada Manuela Aguiar entende que é interessante para os FIIs solicitar a restituição de valores pagos. "Os FIIs fazem a gestão do dinheiro de terceiros. Existindo a chance de trazer um benefício para o investidor, de melhorar a sua rentabilidade, não vejo razão pela qual um gestor não pediria a devolução".

Decisão irreversível?

Na mesma linha, os dois executivos entendem que a imunidade de ITBI nas operações de integralização de capital social está praticamente definida. 

"No meu ponto de vista, é uma decisão pacificada. Ao menos que haja uma alteração na Constituição através de uma emenda constitucional, esse tema está decidido", garante Abreu. "É uma decisão que vincula
as instâncias inferiores", complementa Aguiar.

Enquanto isso, o vice-presidente da Brookfield Asset Management enxerga maiores possibilidades de reviravolta. "Ainda que tenha sido objeto de repercussão geral, conversando com alguns colegas do mercado imobiliário, tributaristas e escritórios de advocacia, percebemos que muitos ainda vêem com alguma ressalva esta decisão", aponta Taier.

Já o head of Legal da Autonomy Investimentos acredita que a mudança seja irreversível, mas faz críticas em relação à sua clareza. "Foram feitos alguns raciocínios sinuosos para chegar em determinadas conclusões, então talvez caiba buscar esclarecimentos sobre pontos específicos do tema", finaliza Farley Menezes.


Por Daniel Caravetti