Diálogos com jovens líderes imobiliários: Bruno Sindona

CEO da Sindona Incorporadora fala sobre desafios de atuar no segmento residencial popular, vida política e mais.

23 de novembro de 2018Mercado Imobiliário
Bruno Sindona é um dos CEOs mais jovens do mercado imobiliário brasileiro. À frente da incorporadora que leva seu sobrenome e que soma aproximadamente uma década de atuação, ele mira desenvolvimentos populares na parte Oeste da Região Metropolitana de São Paulo, incluindo cidades como Cotia, Carapicuiba, Osasco, projetos em Barueri. Mescla um perfil sonhador – em busca de entender e atender às necessidades do público de baixa renda – e ao mesmo tempo crítico – por exemplo, a práticas do mercado e à dependência e concorrência por funding da Caixa Econômica Federal no programa Minha Casa Minha Vida.

Nesta entrevista, concedida pouco antes de participar do Brazil GRI 2018, no qual moderou painel com o jornalista William Waack, ele conta os episódios que o conduziram ao posto que ocupa hoje, revela os planos de crescimento da Sindona Incorporadora para 2019, e ainda explica por que decidiu participar ativamente da vida política do País. Acompanhe os principais trechos da conversa, que abre a nova série 'Diálogos com jovens líderes imobiliários' do GRI Hub


Como começou sua história no setor imobiliário?
Minha bisavó foi desenvolvedora imobiliária – uma mulher maravilhosa, visionária e que fez seu primeiro bairro [em Osasco] em 1957. Entretanto, os herdeiros não tiveram essa mesma visão. Conhece aquela história do pai rico, filho nobre, neto pobre? Agora, imagine que a minha geração já é a bisneta… 

Sua bisavó foi uma grande influência para você, então?
Ouvi falar muito dela. Era 'fora da curva'. Seu pai veio de Portugal e conseguiu criar um bom patrimônio. Ela, por sua vez, ampliou esses recursos focando em real estate. Começou com loteamentos, depois abriu uma imobiliária e foi crescendo. Deixou um legado. Até hoje, o nome dela me abre portas. Contudo, como minha família é muito grande, minha mãe herdou apenas uma fração de um terreno.

Foi esse o terreno que deu origem à Sindona? Como foi esse episódio?
Minha mãe era comerciante, tinha um salão de cabeleireiro, e meu pai sempre trabalhou com obras, como empreiteiro, mas nunca com contratos grandes. É engraçado porque meu lado materno me trouxe a veia de incorporação, ao passo que o paterno, a da construção. O valor da parte do terreno que minha mãe herdou equivaleria hoje a seis apartamentos populares. Para nossa realidade, essa herança seria o que mudaria nossa vida completamente. Vendemos esse terreno em permuta e a empresa [incorporadora adquirente] quebrou. Foram feitas duas torres, mas ficaram inacabadas e aconteceu de serem invadidas pelos compradores. Em meio a esse cenário, demos início a uma briga grande para retomar esse empreendimento e ter o terreno de volta. Essa discussão de propriedade e desembaraço se alongou por seis anos, mas conseguimos encerrar. A essa altura, meu pai e eu já imaginávamos que poderíamos tocar essa obra.

Você era muito jovem, não?
Nessa época, eu tinha 18 anos; porém, comecei a trabalhar aos 12. Estava sempre envolvido no comércio da minha mãe, em obras do meu pai ou em outras iniciativas. Minha família sempre foi empreendedora. Nunca esteve na nossa conta precisar arrumar um emprego. O foco era criar nossas próprias oportunidades.

Vocês viram naquela situação uma grande oportunidade de negócio? 
Na verdade, hoje podemos olhar como oportunidade, mas na época não foi. O que queríamos era salvar o que tínhamos perdido. De pronto, abraçamos a aquilo com a intenção de transferir para alguma incorporadora; porém, não conseguimos, pois havia muitos problemas e ninguém acreditava no negócio. Foi aí que dissemos: 'Vamos fazer nós mesmos!". Fomos elaborando essa ideia de montar nossa incorporadora; porém, não sabíamos nada [sobre como conduzí-la]. 


Bruno Sindona (Sindona Incorporadora) e o jornalista William Waack durante o Brazil GRI 2018

De que modo se deram esses primeiros passos da Sindona?
A Caixa ajudou para que as duas torres que a empresa anterior vendeu fossem terminadas e tivessem boa habitabilidade. Nisso, abrimos uma companhia e nosso ideal era levantar uma torre para provar que éramos capazes. Lançamos um primeiro empreendimento em setembro de 2008. Íamos ao plantão dos concorrentes, víamos o que estavam fazendo e replicávamos. Nosso escritório era na nossa casa, no meu quarto, e depois passou a ficar no próprio plantão de vendas. Nos virávamos com tudo e, no fim, funcionava.

Logo na sequência veio a crise do subprime, iniciada nos Estados Unidos. Sentiram os impactos?
Foi um revés muito grande. Duas semanas depois desse lançamento, o Lehman Brothers quebrou. Enfrentamos um vale. Ninguém sabia se o mundo acabaria ou continuaria. Aí, passados alguns meses, o [então presidente] Lula lançou o [programa] Minha Casa Minha Vida, que deu uma grande aquecida no mercado, a ponto de aparecer comprador disposto a adquirir apartamento de quem nunca tinha feito. 

Vocês adotaram uma postura agressiva para aproveitar essa ocasião?
Vendíamos abaixo do preço de mercado para conseguir viabilizar [os negócios]. Fizemos a primeira obra, mas com prejuízo. Aí fomos aprendendo, desenvolvendo e entendendo o que era interessante. Criamos outros empreendimentos e fomos caminhando, sempre preocupados em entender por que o mercado de incorporação gera tanta insatisfação. Observamos que, com as práticas do mercado que permanecem ainda hoje, o cliente compra e sai insatisfeito. Demoramos muito para decifrar por que ele não tem uma experiência positiva, e isso se deve a várias pequenas coisas. 

Que coisas?
O cliente não é tratado como deve. Um cliente que compra um apartamento de R$ 150 mil desembolsa um valor muito pequeno para o mercado imobiliário. Contudo, para ele, trata-se de uma dívida de 30 anos. E, convenhamos, ainda é um tíquete de R$ 150 mil. Sempre brinco com os corretores: 'Se esse cliente vai ao [shopping] JK Iguatemi adquirir três relógios Rolex, como vai ser tratado?'. Ora, são os mesmos R$ 150 mil. Se a Sindona lucra mais ou menos do que a Rolex, é uma outra conta e problema meu. O fato é que o cliente vale esse montante e deve ser tratado como tal. Por conta de conhecer essa realidade em que o cliente de periferia, de baixa renda é maltratado, inovamos e criamos um novo método e um novo conceito para nossos produtos. 
 

"Um cliente que compra um apartamento de R$ 150 mil desembolsa um valor muito pequeno para o mercado imobiliário. Se ele vai ao [shopping] JK Iguatemi adquirir três relógios Rolex, como vai ser tratado? Ora, são os mesmos R$ 150 mil"


Veio daí a ideia de promover diferenciais nos empreendimentos populares, inclusive via tecnologia, tema que você abordou em matéria da GRI Magazine?
Quando uma família compra um apartamento, quer que seja o mais bonito da rua. Temos que promover isso no prédio, seja com uma pintura, um paisagismo ou outro elemento arquitetônico do qual o morador se orgulhe. Essas famílias, ao se mudar para um empreendimento que tem lazer, wi-fi disponível para as crianças e um ambiente harmônico para viver bem, se desenvolvem. E é isso que a Sindona busca vender agora.

Temos visto grandes incorporadoras se voltando com mais força recentemente ao Minha Casa Minha Vida. Quais os impactos desse movimento para players de menor porte e locais, como a Sindona?
Pode ser que eu esteja sendo radical demais, mas vejo esse movimento como puro oportunismo. Não noto essas empresas realmente pensando no cliente final, no desenvolvimento que podem proporcionar. Me parece muito mais uma opção de investimento para se protegerem num momento difícil. 

Mas isso traz uma concorrência adicional para vocês, certo?
O que preocupa a Sindona é a concorrência por funding, não por mercado, pois não temos problema para vender. O ‘x’ da questão é que dependemos de uma 'mãe' só, que é a Caixa Econômica. Hoje, a Caixa não tem recurso para financiar o final do ano e já está pedalando para que façamos projeto para 2019. Isso preocupa muito. 

Como é ser um líder jovem num ramo tão tradicional como o imobiliário? 
Quem é antigo no setor e tem uma boa percepção de mundo abre espaço para os jovens líderes. Isso não quer dizer excluir o que veio antes. Nós, jovens, precisamos de mais experiência, track record, conhecimento e histórico agregado, o que esse pessoal todo tem. Por outro lado, os líderes mais antigos devem ficar um pouco assustados com tantas novidades. Eu tenho 30 anos e às vezes me espanto com tecnologias que não conheço. Entendo que temos muita coisa positiva para trocar, e o GRI é uma oportunidade de nos encontrarmos. Quando os líderes mais jovens e mais velhos se juntam, o potencial é gigantesco. No entanto, tem que haver essa abertura, tanto de nós não termos preconceitos com o anterior, quanto de os mais antigos permitirem a nós esse acesso. Se conseguirmos nos conectar, vai ser mágico tanto para a evolução do mercado quanto para reduzir as chances de erros.
 

"Nós, jovens, e os líderes mais antigos temos muita coisa positiva para trocar, e o GRI é uma oportunidade de nos encontrarmos. Se conseguirmos nos conectar, vai ser mágico para a evolução do mercado"


Que principais diferenças vê entre o setor imobiliário hoje e quando começou a atuar nele?
A maior diferença é a relação de oferta e demanda. Lá atrás, havia uma demanda muito reprimida, de anos e anos, pronta para consumir qualquer que fosse o produto. Hoje, é diferente. A oferta de produto é muito maior e a demanda precisa ser garimpada, o que exige melhoria do produto. Os lançamentos que estão aparecendo na cidade, em comparação com os últimos que vieram no outro ciclo, são completamente diferentes, tanto em tecnologia quanto em design e atendimento. O cliente não tem mais aquela velocidade, aquele ímpeto. Com raríssimas exceções, não se veem lançamentos com fila na porta, o que era natural em 2009 e 2010. Isso está fazendo os players do mercado olharem para dentro e entenderem o produto. Temos que brigar por produto. Quem compra o primeiro imóvel, principalmente, não adquire valor de metro quadrado, e sim o produto que melhor se adequa à sua vida. Se compreender as pessoas para poder oferecer produto [adequado], o mercado vai ter uma vida próspera nos próximos anos. 

Como a Sindona está fechando 2018 e o que planeja para 2019?
Hoje, a Sindona é um empresa que não tem produto em estoque. Em 2019, estimamos lançar quatro empreendimentos [na parte Oeste da Região Metropolitana de São Paulo], o que para nós é um volume bastante grande. Para os próximos 24 meses, temos no pipeline 1800 unidades [residenciais] para lançar, além de um projeto mixed-use em Osasco.

Você já demonstrou interesse em entrar para a vida pública. Como isso surgiu e quais são os seus planos?
Tenho vontade não de ser político, mas de fazer política. Em real estate, interagimos com o cenário político o tempo inteiro. Tudo depende disso, sejam liberações, alvarás ou funding. Nessas interações, percebi como falta gente capacitada no poder público, contribuindo com seu tempo. A política tem meios de resolver problemas estruturais. O que busco é estar próximo para participar de discussões. Acho que o empresariado precisa se posicionar politicamente. Acredito na política partidária porque é a representação democrática. Se não isso não acontecer, como vamos conduzir o País? Mas, se não for assim, que exista participação em fóruns. Há que se fortalecer as entidades civis, as associações. Esse tipo de debate vai fazer o Brasil evoluir num sentido mais lógico e preciso. Na história, industriais, médicos e tantos outros profissionais foram vereadores, secretários e apoiaram o desenvolvimento nacional. Muitos construtores se tornaram nomes de ruas por conta dessa contribuição. No entanto, em algum momento se ausentaram. Acho que está na hora voltarmos a participar, sem medo.


Entrevista concedida à editora Giovanna Carnio