Aprovado na Câmara Municipal de SP, PIU Setor Central divide opiniões

Texto aguarda sanção do prefeito Ricardo Nunes; MP ajuizou ação civil pública

15 de setembro de 2022Mercado Imobiliário
A Câmara dos Vereadores de São Paulo aprovou de forma definitiva o Projeto de Intervenção Urbana Setor Central (PIU Setor Central), no último dia 25. O texto final aguarda sanção do prefeito Ricardo Nunes, mas nos bastidores divide opiniões no mercado imobiliário e enfrenta resistência do Ministério Público Estadual. 

Na semana passada, o MPSP ajuizou ação civil pública - com pedido de liminar - para suspender o projeto, o que é visto como um componente de incerteza para as incorporadoras, conforme explica o diretor da TPA Empreendimentos, Mauro Teixeira: “Se embargar o PIU, volta a valer a Operação Urbana Centro?”.

Junto ao Secovi-SP, empresas do setor solicitam que o prefeito Ricardo Nunes vete três artigos do PIU Setor Central, conforme detalha Teixeira: “Um deles obriga a fazer apartamentos a partir de um determinado tamanho, e o que pedimos é que o Poder Público não interfira na tipologia”. 

Outro artigo, continua, foi incluído de última hora e “prevê que se a incorporação levar mais de 24 meses entre a obtenção do alvará de execução e o habite-se, a incorporadora terá que pagar a outorga onerosa, mesmo que o projeto seja construído dentro do prazo de isenção, que é de cinco anos”. 

Por fim, um terceiro veto demandado pelo setor diz respeito à tabela sobre fator de planejamento dentro da área atual da Operação Urbana Centro. “É mais uma inconsistência do que uma questão concreta, já que o artigo a que se referia essa tabela foi retirado da redação, mas ela permaneceu”.

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Mesmo que as expectativas do mercado sejam atendidas e os vetos ocorram, Teixeira avalia que o PIU Setor Central continua ruim, com muito mais pontos negativos do que positivos para a cidade. 

“A lei tem o objetivo de levar mais pessoas para o centro, e se a intenção é essa, o poder público deveria baratear a habitação, mas ao colocar uma outorga onerosa, está fazendo o contrário”, opina o executivo.


TPA Empreendimentos tem foco na região central de São Paulo, mas está em compasso de espera devido às incertezas em relação ao PIU Setor Central. Foto: Divulgação/TPA

Prestes a ser substituída, a Operação Urbana Centro isenta as incorporadoras do pagamento de outorga onerosa no desenvolvimento de projetos na região. “A lei vigente é de 1997, e mesmo não prevendo o recolhimento da outorga, com um potencial construtivo maior que o do resto da cidade, não conseguiu revitalizar o centro como se esperava; ao colocar uma taxa extra, piora”, conclui Teixeira.

O advogado Rodrigo Bicalho, sócio do escritório Bicalho ADV, elogia o projeto ao entender que construções antigas da região têm potencial construtivo bastante elevado que podem ser aproveitados na requalificação imobiliária, sem a necessidade de demolição ou adequação integral às regras atuais. 

“Outro ponto importante é permitir um potencial construtivo de quatro a seis vezes a área do terreno em boa parte do perímetro, permitindo maior rentabilidade às empresas, bem como o incentivo a empreendimentos mistos e com fachada ativa, como lojas, cafés, restaurantes, que trazem recursos para a prefeitura por meio de impostos”, assinala o executivo. 

Um ponto de atenção, segundo Bicalho, é a ampliação da área abarcada pelo PIU Setor Central, equivalente a 20 milhões de metros quadrados, estendendo-se a distritos como Bom Retiro, Catumbi e Pari.  

Em relação à outorga onerosa, o especialista diz que ela se mantém isenta no centro histórico, em regiões como Sé e República, pelos próximos cinco anos, prazo obtido durante as conversas entre poder público e iniciativa privada. “No início, a prefeitura não ouviu muito o setor, parecia ter uma visão muito própria dos estudos realizados, mas depois houve uma sensibilidade maior”. 

Cracolândia 

O sócio-fundador da Mogno Capital, Daniel Caldeira, acrescenta que além das questões imobiliárias, a prefeitura precisa resolver o problema da Cracolândia. “Fizemos o retrofit de um prédio na região que rapidamente foi 100% alugado, e já aconteceram tentativas de roubos e até invasão. É uma situação complexa, mas que não pode ser deixada nas mãos da iniciativa privada”. 

O executivo também ressalta a importância do investimento em infraestrutura na região, classificada por ele como um tesouro: “Vejo muitas oportunidades na região, é uma mina de ouro, mas fico com o ‘pé atrás’; a prefeitura vai cumprir com a sua parte? Pensa se você investir, fizer um projeto super legal, mas a cracolândia está na sua porta, o que fazer?”, questiona. 

Caldeira acredita que a partir do ano que vem, com a provável queda da taxa de juros, as oportunidades vão se tornar ainda mais atrativas na região; hoje, contudo, a presença da Mogno no centro de São Paulo é “zero”, conforme conta: “Fizemos esse retrofit no edifício Francisco Malta Júnior, entregamos um pouco antes da chegada da pandemia, mas mesmo assim foi um sucesso”. 

A empresa então abriu um fundo, captou recursos e adquiriu mais quatro prédios com o mesmo propósito, mas a combinação de covid-19, expansão da cracolândia e aumento da taxa de juros mudou os planos: “Vendemos todos os prédios e saímos da região. Conseguimos uma TIR próxima de 16%, então os clientes do fundo ficaram satisfeitos”. 

Compasso de espera

Com uma história de catorze empreendimentos na região, dentre os entregues, em obras e lançamentos, e um VGV total que supera os R$ 800 milhões, a TPA adotou como estratégia aprovar todos os projetos antes da promulgação do PIU. “Desde então, paramos de investir no centro enquanto há essa discussão, até porque as primeiras versões do projeto sequer previam direito de protocolo, eram realmente muito nocivas”, afirma Teixeira. 

“Na versão final, houve melhorias a pedido do setor, das entidades, reduzindo a insegurança jurídica dos investimentos, mas essa marola foi ruim em termos de desenvolvimento, pois não só a TPA, como outras empresas, devem ter parado de negociar até conhecer a versão final da lei”, ratifica o executivo. 

Entre solicitações de lado a lado - incorporadoras e movimentos sociais -, Bicalho acredita que há um equilíbrio razoavelmente bom no PIU Setor Central: “40% da outorga onerosa terá que ser destinada para construção de habitação social, e eu acho isso bastante”. 

Sobre as contestações judiciais, o especialista crava: “Seria muito frustrante para a cidade, depois de muito debate, ter eventuais alegações que levem a uma liminar que suspenda por dois, três ou dez anos a implantação do projeto. O centro de São Paulo não resiste a tanto tempo sem um plano efetivo de recuperação da infraestrutura”.

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Por Henrique Cisman