Regionalização é melhor caminho para gerar escala no saneamento básico

Novo Marco Legal coloca como meta a universalização dos serviços de água e esgoto até 2033

13 de maio de 2021Infraestrutura

A sanção do Novo Marco Legal do Saneamento Básico foi um importante passo para melhorar a prestação dos serviços de abastecimento de água, coleta e tratamento de esgoto e manejo de resíduos sólidos no Brasil, mas há outros avanços relevantes para que isso aconteça de fato. 

Um deles é a regionalização, mecanismo previsto no
Decreto Nº 10.588, publicado em dezembro do ano passado, que apresenta as diretrizes gerais para o apoio técnico e financeiro da União neste processo. 

Ao longo dos últimos quatro meses, a divisão de conteúdo do GRI ouviu líderes de empresas que atuam com saneamento básico no Brasil, sejam elas privadas ou de economia mista, como é o caso da Sabesp. Dentre outras questões que permeiam a nova legislação do setor no país, os executivos avaliaram a regionalização. 

Segundo a CEO da BRK Ambiental, Teresa Vernaglia, a regionalização é exatamente o que explica o fato de a empresa - a maior companhia privada de saneamento básico do Brasil - conseguir atender municípios minúsculos, cuja população é inferior a 5 mil habitantes. “O investidor privado não entra em uma operação se ela não fizer sentido [do ponto de vista] econômico-financeiro. Tudo é uma questão da forma como o edital é montado”. 

Para a executiva, um bom exemplo é a modelagem da CEDAE, no Rio de Janeiro, cujo leilão ocorreu após a realização da
entrevista de Vernaglia para o GRI. “A grande inteligência é haver blocos de regiões mais atrativas do ponto de vista econômico-financeiro junto com aquelas menos atrativas neste mesmo aspecto. No combinado, faz sentido para o investidor e garante que toda a população tenha acesso ao saneamento básico”.

No exemplo mencionado, três dos quatro blocos colocados no leilão foram arrematados pela iniciativa privada com ágio superior a 100% em todas as propostas vencedoras. O único bloco sem interessados foi o 3 (em breve, publicaremos reportagem completa sobre a concessão da CEDAE). 

Sobre o aspecto da viabilidade, o presidente da Sabesp, Benedito Braga, faz um alerta que vai ao encontro da necessidade de regionalização: “Os municípios menores, que não têm renda importante, terão enorme dificuldade para fazer uma licitação e uma empresa privada prestar o serviço num local em que, quando se faz a avaliação econômico-financeira, o resultado é muito inferior ao que é esperado pelos acionistas”. 


Na entrevista concedida ao GRI, Braga argumenta que o setor privado obviamente vai priorizar as licitações que tenham municípios de maior porte, nos quais a rentabilidade também é maior. “Dizer que agora, com o Novo Marco Legal do Saneamento Básico, o setor privado entra e acabou o problema... não é assim, de jeito nenhum. O governo [federal] continua tendo responsabilidade com o saneamento”.

O CEO da SUEZ Brasil, Federico Lagreca, ressalta que 75% da atuação da iniciativa privada em concessões ou PPPs de saneamento básico no país ocorrem justamente em municípios pequenos. Para ele, o grande desafio é atingir o equilíbrio econômico-financeiro de modo que a universalização seja alcançada mediante a cobrança de taxas “adequadas” junto aos consumidores. 

O executivo elogia a abordagem da regionalização que consta no Novo Marco Legal e enxerga que há atratividade para a participação do setor privado, porém destaca que este não é o único desafio. “É difícil unir os municípios no mesmo ideal; não vai ser fácil alcançar [um consenso]”, assinala. 

Pelo disposto no Decreto Nº 10.588, os Estados têm até o dia 15 de julho para fazer as divisões dos blocos regionais que terão as operações de água e esgoto compartilhadas. Após esse período, caso ele não seja estendido, a própria União assumirá a tarefa de formação dos blocos. 

“Se todo mundo trabalhar com proatividade, abrir a cabeça e entender que faz sentido um esforço para alinhar expectativas e interesses e trazer a melhor prestação de serviço, levar água potável e tratar o esgoto da população, será um bem para o país: vai gerar empregos, alavancar a economia e melhorar a saúde pública”, enfatiza Lagreca.


Um destaque feito pelo CEO da Aviva Ambiental, Alexandre Lopes, é que apesar de a legislação incentivar a criação de blocos regionais para ter maior escala no atendimento visando a universalização, o Decreto também traz a definição dos serviços de interesse local, cuja adesão aos blocos é facultativa. 

“Quando o município não está inserido em uma região metropolitana e tem a solução dentro de seu limite territorial, ou seja, não está integrado com nenhum outro sistema, ele pode também adotar soluções individuais, pode partir para modelagens que contemplem somente a sua cidade”, explica Lopes.

O executivo acredita que haverá ambos os modelos - blocos regionais e soluções individuais de municípios. “Sem dúvida que isso vai atrair novos entrantes, sejam fundos de investimentos, empresas internacionais e também aquelas que já estão posicionadas no setor aqui no Brasil”, afirma.

Teresa Vernaglia, CEO da BRK, faz um paralelo: “Não há discussão hoje sobre qual município tem ou não telefonia celular porque isso é um modelo. A gente já viu em outros setores da infraestrutura que esse é um dilema que não existe desde que a modelagem seja corretamente elaborada, e é isso que o marco legal do saneamento traz no momento em que coloca o dispositivo da regionalização: criar escala e garantir que de fato o saneamento chegue para todos”.


Por Henrique Cisman