Pressa ou razão na antecipação de renovações de ferrovias?

Para players, iniciativa é crucial a novos investimentos e ao desenvolvimento nacional.

20 de abril de 2018Infraestrutura

Caminhando lentamente desde 2015, o pedido de concessionárias ferroviárias de renovação antecipada de seus contratos pode ter avanços significativos ao longo de 2018. As discussões se intensificaram no último ano, após a sanção da Lei 13.448/17, originária da MP das Concessões [752/16] e que estabelece as diretrizes gerais para prorrogação e relicitação dos acordos de parceria nos setores rodoviário, ferroviário e aeroportuário da administração pública federal. Com isso, abriu-se espaço para que as propostas fossem, de fato, analisadas pelo governo. 

São cinco as concessões nessa situação. Controladas por Rumo Logística, MRS, VLI Logística e Vale, operam um total de 13.526 km de estradas de ferro e demandam a manutenção dos seus contratos por 30 anos adicionais.

De acordo com estudo do Grupo de Economia da Infraestrutura & Soluções Ambientais da Fundação Getúlio Vargas (FGV) divulgado em março, as prorrogações de contratos ferroviários podem garantir 696 mil novos postos de trabalho gerados antecipadamente, R$ 42 bilhões para o PIB, massa salarial em torno de R$ 7 bilhões e R$ 3 bilhões em tributos. A pesquisa foi iniciada após questionamentos do Tribunal de Contas da União (TCU) sobre a pertinência das renovações, assim que foi apresentada a primeira solicitação. 

Primeira demanda, da Rumo

À frente da Malha Paulista, cujo contrato vai até 2028, a Rumo foi a primeira a pleitear a continuidade de sua gestão, por meio de um termo aditivo. A companhia principiou suas articulações durante a gestão de Dilma Rousseff, mas o processo só evoluiu após Michel Temer assumir a Presidência. 

“Um dos apontamentos [críticos] do TCU e de alguns órgãos ocorreu justamente porque o governo estava mudando sua política de regulação. Durante a gestão Dilma, se optou por um modelo de desverticalização do setor e, agora, na renovação antecipada, está sendo dada preferência ao modelo verticalizado”, diz Fernando Marcato, integrante da equipe que elaborou o estudo da FGV. No formato verticalizado, uma única empresa é responsável pela gestão da infraestrutura e pela prestação do serviço de transporte.

A proposta da Rumo, apresentada à Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), já passou pelas audiências públicas previstas em todos os procedimentos de antecipação para discutir os termos da renovação, além da viabilidade e dos interesses da sociedade em relação aos projetos sugeridos. “Atualmente, o processo da Rumo está em ajuste final dos estudos técnicos, depois das contribuições da audiência pública. Posteriormente, será enviado ao Ministério dos Transportes e, em seguida, ao TCU”, confirma, por meio de nota, a ANTT.

“Avançamos ao longo dos últimos meses em questões mais delicadas. Já temos propostas bem maduras para todos os pontos centrais, protocoladas na ANTT e sob análise do governo para que consigamos um desfecho”, avalia, por sua vez, Guilherme Penin, diretor de Assuntos Regulatórios e Institucionais da companhia.

Para ele, contudo, variáveis externas à própria atuação da concessionária, como a conjuntura do País, podem interferir nas negociações. “Sabemos que estamos em um ano muito difícil, mas acreditamos que chegaremos a um acordo”, complementa.

Demais pedidos em curso

A MRS Logística, a cargo de 1,6 mil km na região Sudeste, está na fase de detalhamento de seu plano de negócios. De acordo com o presidente, Guilherme de Mello, foi constituído “um plano robusto e tecnicamente impecável, no ponto de equilíbrio entre as diretrizes da agência e a sustentabilidade em termos dos investimentos que serão assumidos, e que permitirá à empresa continuar crescendo”.

Após as consultas populares, a ANTT irá consolidar as contribuições relativas a esse caso e emitir um relatório conclusivo. Essa consideração técnica será ainda avaliada por outras instâncias públicas, como o TCU e a pasta dos Transportes, para permitir a repactuação.
 
Por meio de nota, a Vale, que responde pela Estrada de Ferro Vitória-Minas (EFVM) e pela Estrada de Ferro Carajás (EFC), também informa ter progredido no diálogo junto com o poder público. “As discussões técnicas e os entendimentos estão sendo feitos com a ANTT”, aponta. Os contratos vão até 2027 e, se estendidos, podem chegar a 2057. “Uma vez acordadas as condições para a antecipação das renovações da EFVM e da EFC, caberá ao governo federal definir as contrapartidas a serem implementadas”, indica a companhia. 
 
Também em etapa inicial encontra-se a renovação do contrato da VLI Logística, que opera a Ferrovia Centro-Atlântica (FCA) e preferiu não se pronunciar sobre o assunto.

Segundo a ANTT, as audiências públicas que vão analisar as propostas da Vale e da MRS devem acontecer neste segundo trimestre e as das VLI, a partir de julho.
 
Propostas de investimento
 
O diretor da Rumo sustenta que, sob a ótica da efetivação de investimentos, adiantar a renovação é absolutamente crucial, pois dá ao concessionário prazo para que possa amortizá-los. "Nosso plano de obras [na Malha Paulista] é de seis anos de execução, ou seja, se iniciarmos em 2019, terminaremos em 2025 e o contrato se encerraria em 2028. Então, é evidente que, quando concluirmos o programa, o tempo de vigência não será suficiente para pagar os R$ 6 bilhões de investimentos”, afirma. A companhia prevê investir em diversas melhorias, como a modernização de 1.120 km.

Conforme o executivo, a antecipação da Malha Paulista também é fundamental para a licitação da Ferrovia Norte-Sul (FNS), já que a modernização da primeira atenderá à demanda de volume de carga estimado para a segunda. Com edital liberado em fevereiro, a realização do leilão da FNS ainda depende do parecer final das autoridades, mas deve ocorrer ainda neste ano. “A licitação da Norte-Sul sem a Paulista é inviável”, enfatiza Guilherme Penin.

As demais concessionárias, cujas propostas seguem em análise junto ao governo, não detalharam publicamente seus planos. Contudo, diversas estimativas do mercado têm indicado que os aportes diretos de capital girariam em torno de montantes similares.
 
A MRS declara que “vem fazendo ciclos regulares de investimentos”, mas que prevê aumentar sua capacidade e produtividade, renovar o material rodante, aplicar recursos em novas tecnologias e empreender obras em cidades do entorno da malha. “Nos preparamos bem para este momento e o plano traçado é muito sólido. Daí nossa confiança no sucesso", afirma o presidente, otimista diante das negociações.

Carências a suprir

Os especialistas ouvidos pela reportagem ressaltam que a assinatura dos aditivos traria múltiplos benefícios ao Brasil. “Encontramos elementos importantes que justificam a prorrogação, até porque o País é muito carente de infraestrutura. O quanto antes esses investimentos forem destravados, melhor será para o crescimento – em especial, por esse ser o setor de escoamento do agronegócio”, argumenta Fernando, da FGV. 

Eduardo Padilha, professor de Infraestrutura do Insper, faz coro: “nossa rede ferroviária é muito ruim. Temos de aproveitar esse aditivo para melhorar efetivamente o sistema”. Ele ressalta também a importância de “que sejam agregados [nos novos contratos] indicadores de desempenho operacionais e de manutenção, a um preço justo”.

“Se deixamos para 2028 [quando vence o contrato da Malha Paulista, por exemplo], ficaríamos ainda dez anos sem [novos] investimentos, para então relicitar e o próximo concessionário realizá-los apenas depois de outros dez anos”, completa Eduardo.

 

Veja esta e outras reportagens na 9ª edição da GRI Magazine Infrastructure

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