O papel do Governo Federal no desenvolvimento da infraestrutura subnacional

5 de maio de 2020Infraestrutura
O Governo Federal, por meio de seu Programa de Parceria de Investimentos (PPI), atualmente vinculado ao Ministério da Economia, celebrou um ano de 2019 de robustez em concessões, leilões, estudos e contratos assinados. A expectativa para 2020 se mantinha forte, até os planos mudarem por conta da pandemia. Com o objetivo de apresentar aos membros do GRI Club as estratégias de apoio do PPI aos entes subnacionais e qual está sendo o papel do Governo Federal no suporte às carteiras de estados e municípios, o GRI Club Infra realizou uma reunião on-line com a Secretária Especial Martha Seillier no dia 28 de abril.

A moderação do debate ficou por conta de Teresa Vernaglia, CEO da BRK Ambiental, e o eMeeting contou com cerca de 70 membros do GRI, entre investidores, operadores e especialistas do setor de infraestrutura.

A agenda para 2020, impactos da COVID-19, expectativas e os planos do Governo Federal

O PPI vem em uma importante "curva de aprendizado" e o objetivo permanece aquele de realizar o dobro de leilões do ano anterior. É inegável que o cronograma seja impactado de certa maneira pela pandemia em curso, entretanto, o esforço está concentrado para que nenhum projeto seja paralisado.

Por conta da crise sem precedentes, a Secretária Especial prevê uma série de pedidos de reequilíbrio econômico-financeiro de contratos e discussões sobre Força Maior. O Ministério da Infraestrutura, por meio de sua equipe jurídica, estipulou diretrizes sobre como o Governo Federal deverá atuar nesses casos.

A frente econômica é pauta constante para o Governo neste momento, pois a ajuda concedida a grande parte das empresas e da população, que tiveram seus rendimentos severamente afetados, vem de recursos federais. Há projetos encampados pelo BNDES e pela Caixa Econômica Federal no sentido de mitigar os efeitos da crise nos fluxos de caixa e capital de giro de empresas.

Por outro lado, a recessão atual evidencia a enorme necessidade de capital provindo da iniciativa privada, recursos estes que passam por projetos de infraestrutura, sejam eles por meio de concessões, PPPs ou privatizações. O desafio, então, é como o PPI conseguirá acelerar suas entregas em meio a este momento delicado.

Parcerias com entes subnacionais: sinergias, racionalização e a formação de blocos

A criação do PPI, em 2016, estava baseada na carteira de ativos da União, sobretudo transporte, logística e energia. Com a consolidação dessas concessões, e com o intuito de diversificação da carteira, o Programa passou também estudar seu apoio à atração de investimento privados em outros ativo não-tradicionais, tais como parques, reservas naturais, terminais pesqueiros, entre outros.

Atualmente, o Programa abre seu leque e vem procurando respaldar entes subnacionais na estruturação de seus projetos de concessão e parceria. Estados e municípios brasileiros têm carteiras de ativos de extrema importância e os destaques ficam por conta do saneamento básico, resíduos sólidos e iluminação pública. Adicionalmente, há creches, unidades de saúde, mobilidade urbana, presídios, entre outros. A avaliação do PPI é que o Governo Federal deverá priorizar projetos estratégicos que tenham potencial para contribuir decisivamente com a retomada da economia pós-crise.

Em diversos casos, o Poder Executivo regional não possui recursos financeiros e técnicos para análises de viabilidade (técnica, econômica, ambiental), assessoria jurídica, etapas de consulta pública e estudos de edital e contratos. Por meio do BNDES e do Fundo de Estruturação de Projetos (FEP) da Caixa Econômica, a União auxilia na estruturação destes projetos. Para os projetos escolhidos, o Governo arca com os custos da estruturação, como análises de viabilidade, estudos de engenharia, financeiros e jurídicos, vistorias locais de instalações por parte da Federação ou consultores contratados. Ao final, o Governo só pode reaver os montantes investidos caso os leilões sejam exitosos.

Para o FEP da Caixa, especificamente, a adesão é por via dos chamamentos, e os municípios devem preencher requisitos objetivos estabelecidos pelo banco. Recentemente, a Caixa realizou chamamento para iluminação pública e está em vias de abrir outro para coleta de resíduos sólidos urbanos. Logo após a conclusão destes chamamentos, está previsto o de água e esgoto.

O objetivo claro do PPI é ter uma ampla racionalização dessas estruturações e do suporte prestado pelo Governo Federal, buscando sinergias regionais. Portanto, a formação de consórcios intermunicipais ou interestaduais é um fator muito bem avaliado no momento em que projetos são escolhidos para receber apoio.

Outro ponto importante são as metas traçadas para as obras de infraestrutura. O livre investimento federal, por meio de pacotes nacionais de obras, não deve ser adotado. A alternativa mais viável é a de parcerias com o setor privado, desde a construção do ativo, operacionalização e entrega qualificada do serviço. A absoluta integração de ponta a ponta é o mote do PPI para alavancar o crescimento brasileiro no cenário pós-pandêmico.

Saneamento, resíduos sólidos e manejo de águas pluviais

O saneamento, cuja complexidade federativa traz um desafio a ser atacado, configura uma predileção por projetos consorciados para o PPI.

Sobre este setor estão depositadas grandes expectativas de investimentos privados, sendo um serviço intimamente relacionado à saúde pública - justamente um problema recorrente no país e que, agora, ganha ainda mais destaque. Cabe ressaltar que a universalização do saneamento no Brasil demandaria recursos superiores a R$ 600 bilhões, sendo que União, estados e municípios certamente não têm condições de caixa para tamanho aporte.

Em quesitos técnicos, o Governo Federal auxilia os entes subnacionais com diretrizes, como o Plano Nacional de Saneamento Básico (Plansab). Para financiamento, respalda o acesso a crédito junto a instituições financeiras governamentais, casos do BNDES e da CEF. A Secretária Especial destacou que, em diversos casos, a União destina recursos a fundo perdido para municípios menores por meio da Fundação Nacional de Saúde (Funasa) e do Ministério de Desenvolvimento Regional (MDR).

Dois projetos da parceria de estruturação entre PPI e o BNDES têm destaque:
  • Lançamento do edital para concessão do saneamento de Maceió/AL ainda em maio, e possível assinatura do contrato neste ano. Expectativa de R$ 3 bilhões em investimentos.
  • Projeto de concessão da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae) do Rio de Janeiro, com investimentos previstos de R$ 32 bilhões.
Além destes, outros projetos de saneamento, dentro das carteiras do PPI e do BNDES, devem gerar cerca de R$ 52 bilhões de investimentos no total. Todos já têm suas análises de viabilidade concluídas e estão em fase adiantada de estruturação.

Para resíduos sólidos, o Plansab estima que é necessário um investimento de R$ 28 bilhões na gestão e manejo dos detritos até 2033. Adicionalmente, é preciso aperfeiçoar a política de recuperação de custos para este serviço, visando garantir a sustentabilidade financeira e a continuidade da prestação. Com este objetivo, o Governo Federal lançou recentemente o chamamento público para seleção de consórcios públicos interessados em utilizar recursos do FEP Caixa para a estruturação de projetos de concessões no setor. Atualmente, calcula-se que municípios tenham cerca de R$ 18 bilhões em dívidas ativas com empresas de coleta de resíduos.

Consórcios para gestão associada de resíduos sólidos já estão ocorrendo, com parceria de estruturação com o PPI, em Minas Gerais (13 municípios) e Ceará (10 municípios). Estritamente para municípios atuando isoladamente, estão estruturando a concessão de Teresina/PI e Bauru/SP.

A viabilidade para todos estes projetos foi verificada e, hoje, há maior clareza que a concessão comum é factível e não onerosa para o poder público concedente. As tarifas adotadas (a serem embutidas na conta de água e esgoto) são, a princípio, suficientes para que um serviço de qualidade seja prestado. Municípios e consórcios interessados no acesso ao FEP Caixa devem também considerar o fator estipulado pelo PPI de aproveitamento energético dos resíduos sólidos. Uma possibilidade aventada, em coordenação com Ministérios, é o de um leilão, no futuro, da energia gerada a partir destes resíduos.

Embora seja um segmento menos mencionado nas discussões sobre saneamento, o manejo de águas pluviais (drenagem) teve chamamento autorizado pelo Conselho do FEP, resultando em apoio a dois projetos piloto (Teresina/PI e Porto Alegre/RS) para estruturação de PPP dos serviços de drenagem e manejo de águas pluviais.

A regulação é assunto-chave para o PPI, e defende que diretrizes regulatórias claras são de suma importância para que muitos setores da infraestrutura subnacional recebam investimentos privados (o saneamento é um exemplo claro da falta de investimentos por ter regras frágeis ou conflitantes). O papel da Agência Nacional de Águas (ANA), por exemplo, será mais assertivo e preponderante após a aprovação do marco do saneamento. A regulação também versará sobre contabilidade regulatória, políticas tarifárias e indenização de ativos, pontos que ainda são passíveis de judicialização no Brasil.

Ativos sociais - escolas, presídios, unidades de saúde e outros

O Governo Federal é categórico ao falar sobre ativos sociais: são de extrema importância para a sociedade e precisam, de maneira decisiva, que seus projetos sejam calcados na lógica e na contribuição para a comunidade.

No sistema educacional, para o PPI, há centenas de instalações originalmente voltadas à educação que, hoje, não operam por diversas razões que podem ser endereçadas a partir de investimento privado. A Secretária Especial ressaltou que, em muitos casos, não houve planejamento e provisão adequada de recursos que mantivessem sua função social (ou estão inoperante ou subutilizadas).

Os presídios necessitam de programas de ressocialização baseados em atividades laborais e que gerem renda para os egressos, promovendo, de forma ordenada, o retorno sustentável ao convívio social e evitando a reincidência no sistema prisional. Em diversos casos, indústrias das regiões onde as PPPs prisionais se encontram devem oferecer oportunidades e geração mútua de valor.

O PPI tem conversado com estados e municípios para viabilizar estes projetos e, consequentemente, atrair investidores. Este movimento é uma amostra clara da estratégia que o Programa vem adotando, sobretudo a partir da segunda metade de 2019, no suporte a estados e municípios.

Segurança jurídica para investimentos

Um verdadeiro divisor de águas para os setores são os seus marcos regulatórios, já que garantem maior segurança jurídica a contratos, respaldam o poder concedente e aprimoram a oferta de serviços à sociedade.

Com as pautas legislativas amplamente tomadas, tanto na Câmara como no Senado, por temas emergenciais, textos não urgentes saíram das discussões diárias. Porém, assim que estes assuntos estiverem estabelecidos no Congresso, a prioridade é a retomada das negociações e votações para os projetos que buscam conferir maior segurança jurídica a investimentos privados em infraestrutura. O novo marco regulatório do saneamento, a transformação do setor elétrico e a Lei Geral de Concessões, entre outros projetos em tramitação, devem estabelecer um ambiente jurídico mais estável, que fomente a atração de investidores.