Infraestrutura lidera implementação de ESG em empresas e projetos

Apesar do avanço, ainda há muito o que melhorar, segundo especialistas

7 de maio de 2021Infraestrutura

Todo executivo já ouviu ou leu algumas vezes a palavra ESG, sigla para definir um conjunto de ações que visam boas práticas relacionadas ao meio ambiente, aos aspectos sociais e à governança nas empresas públicas e privadas, além de organizações do terceiro setor. 

Segundo Elias de Souza, sócio da área de Infraestrutura da Deloitte, a preocupação com essas questões tem início ainda na década de 1970, quando a Organização das Nações Unidas (ONU) realizou a primeira conferência internacional em Vancouver, Canadá, para discutir os assentamentos humanos no contexto da precariedade da habitação no mundo.

Vinte anos mais tarde, entraram na pauta outros temas relacionados à sustentabilidade, o que foi confirmado nos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio estabelecidos a partir de uma série de reuniões ocorridas na década de 1990, que culminaram na Declaração do Milênio realizada pela ONU em setembro de 2000.

Para Renata Noschese, supervisora de Sustentabilidade da Deloitte, o contexto de atenção aos aspectos sustentáveis foi fortalecido quando o assunto entrou na pauta do Fórum Econômico Mundial, realizado anualmente em Davos, Suíça. “A partir das questões financeiras, de bancos e investidores [atentos ao ESG], muitas empresas viram que precisam se organizar para dizer que cumprem com a sigla”.

Concomitante aos objetivos do milênio, a ONU lançou um Pacto Global no início do século, liderado pelo então secretário-geral das Nações Unidas, Kofi Annan. A iniciativa estabelece 17 objetivos para o desenvolvimento sustentável (ODS) do mundo, os quais norteiam a Agenda 2030, plano de ação aprovado pelos 193 países-membros da ONU para execução a partir de 2015. 

A Rede Brasil do Pacto Global conta atualmente com 1,2 mil organizações, dentre grandes empresas, pequenas e médias e também organizações não empresariais, como a Controladoria-Geral da União, alguns ministérios e governos estaduais, segundo revela Carlo Pereira, diretor executivo do Pacto no país. 

De acordo com os especialistas, a infraestrutura é o setor que lidera a implementação de ESG nos projetos pelo mundo, o que também ocorre no Brasil. “O ESG vem crescendo e ganhou de vez a pauta no ano passado por causa da pandemia de Covid-19, principalmente na infraestrutura, que movimenta e impacta um grande número de pessoas”, afirma Elias de Souza.

“A gente assimilou que a sustentabilidade realmente afeta a nossa resiliência. Muitas das questões sanitárias nasceram lá atras de problemas ambientais para os quais não olhamos. Tem regiões do Brasil com 10% de tratamento de esgoto, muita gente sem acesso à água, ainda hoje. Precisa consertar o problema na raiz”, completa o executivo.

Pereira endossa que todo o pacote de recuperação econômica dos Estados Unidos e em boa parte da União Europeia é inteiramente focado na infraestrutura verde: “É um setor que sempre foi a saída para crises, com geração de muitos empregos etc., mas a diferença é que agora todos estão focando na renovação da infraestrutura que estava aí, rumo a uma infraestrutura sustentável”. 

Mesmo no Brasil, que muitas vezes demora mais a executar as tendências mundiais, o porta-voz do Pacto Global já enxerga iniciativas importantes. “Nas últimas licitações de rodovias do Governo do Estado de São Paulo, por exemplo, já havia questões sociais e voltadas ao meio ambiente, questões de sustentabilidade”.

Outro bom exemplo vem do Paraná, onde cidades conseguiram modernizar a infraestrutura de iluminação pública com financiamentos de juros baixos graças aos ODS. “O dinheiro foi repassado pelo BRDE (Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul) e veio de uma agência de fomento francesa em uma linha criada após o Acordo de Paris”, conta Pereira. 

Longo caminho a percorrer

Embora haja movimentos importantes como os descritos acima, a Agenda 2030 não caminha tão bem quanto se espera. Em alguns aspectos, inclusive, houve uma regressão nos últimos anos, como aumento da fome e da pobreza no mundo e também um repique de mortalidade infantil em solo nacional, conforme afirma o diretor executivo da Rede Brasil do Pacto Global. 

“Além disso, as questões ambientais nunca estiveram boas e não chegamos a melhorar. Houve uma redução nas emissões [de gases poluentes] por conta da pandemia, assim como ocorreu em 2009, na crise financeira dos Estados Unidos. Fato é que, hoje, no Brasil, a gente só atingiria o ODS 7, de energia acessível e limpa, por conta da vocação natural que o país tem”, ratifica Carlo Pereira.

Segundo Elias de Souza, sócio de Infraestrutura da Deloitte, o ESG ainda está muito segregado nos departamentos das empresas, isto é, cada pessoa ou grupo de trabalho cuidando apenas de determinada frente, quando o ideal é que as ações sejam integradas. Outro ponto é a dificuldade de mensurar se as iniciativas conseguem alcançar os objetivos do Pacto Global.

Neste sentido, a Deloitte tem atuado como consultora na modelagem de projetos de infraestrutura, como em concessões e parcerias público-privadas (PPP), para que haja comprometimento com o meio ambiente, com a sociedade e com a boa governança dos projetos. “O número de pedidos aumentou bastante depois da chegada da Covid-19; está na mesa a preocupação sobre o que a empresa provoca e como pode retribuir para a sociedade”, afirma Souza.

Segundo Renata Noschese, de dois anos para cá, a própria Deloitte “avançou do assistencialismo, da filantropia, de ações sem continuidade, para uma estruturação de áreas que visam atender todas as diretrizes do Pacto Global”. Um exemplo disso são as aulas oferecidas a crianças, jovens e adultos por profissionais da companhia ao longo do ano. 

“O que a gente está fazendo agora na Deloitte é fortalecer o tema e engajar as pessoas nele porque elas ainda não sabem exatamente o que tem a ver direitos humanos, equidade de gênero etc. com sustentabilidade. É um trabalho de engajamento junto a clientes, fornecedores e sociedade de modo geral”, pontua a especialista.

No Brasil, em relação à equidade de gênero, 21 empresas aderiram ao Pacto Global para o cumprimento de uma entre duas metas: 30% de mulheres em cargos de liderança até 2025 ou 50% até 2030. “É uma mudança agressiva, já que não existia nada nesse sentido até agora”, finaliza Pereira.


Por Henrique Cisman