Compartilhamento do risco de demanda é elogiado por operadores de rodovias

Ministério da Economia publicou nota técnica sugerindo medida ao governo federal

25 de outubro de 2022Infraestrutura
No Brasil, o player que investe em projetos de concessões rodoviárias costuma lidar com a incerteza sobre o retorno do investimento, uma vez que os problemas estruturais de demanda desafiam ofertas otimizadas e previsíveis. Nesse sentido, o compartilhamento do risco de demanda pode ser uma boa alternativa para mitigar o problema.

Em agosto, a Secretaria de Desenvolvimento da Infraestrutura (SDI) do Ministério da Economia publicou uma nota técnica sugerindo ao governo federal que analise a possibilidade de incrementar o mecanismo para tornar mais atrativas e concorridas as concessões de rodovias.

Tido como um importante avanço em matéria de alocação eficiente de riscos nos projetos, o compartilhamento do risco de demanda poderia atrair novos investidores para os contratos. Danillo Marcondes, diretor de investimentos em infraestrutura da GLP, conhece bem a dinâmica. Um dos ativos em operação pela companhia é a Ecovias do Araguaia - em consórcio com a EcoRodovias - , que é exceção no mercado ao possuir o mecanismo. 

Ele afirma que os projetos relevantes, que demandam grandes volumes de financiamento, certamente teriam mais facilidade no momento de captar financiadores para o plano de negócios. “Estou certo de que, se o compartilhamento do risco de demanda for expandido, será uma excelente ferramenta para o governo viabilizar mais projetos e atrair novos investidores ao setor de rodovias”. 

Vale informar que nas concessões brasileiras, o risco costuma ser todo alocado ao ente privado. Como em todo investimento, quanto maior o risco, maior o retorno esperado, o que muitas vezes se traduz em tarifas maiores para os usuários. De acordo com a SDI, em parceria com o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), o compartilhamento do risco de demanda pode reduzir em até 22% o valor da tarifa. 
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Outros seis executivos entrevistados pelo GRI Club também avaliam o impacto do mecanismo e a possibilidade de o mesmo ser inserido em futuros contratos. Aquilino Espejo, diretor de concessões da Sacyr Brasil, acrescenta uma terceira esfera beneficiada, além do governo e da iniciativa privada: as instituições financeiras. 

“Do lado dos financiadores também tem muito impacto, pois o compartilhamento de risco aumenta a confiança na base de receitas que sustentará o projeto e garantirá o pagamento do financiamento. Tudo isso se reflete em projetos mais seguros a longo prazo, com melhor atratividade para investidores e financiadores e, por fim, menor custo para o usuário final”, avalia o executivo.

Risco variável

Segundo as fontes ouvidas pela reportagem, a aplicação do mecanismo deve ser personalizada conforme as características de cada projeto, de modo que o compartilhamento seja adequado ao nível de risco. Para Giane Zimmer, diretora executiva de relações institucionais e sustentabilidade da Arteris, não há fórmula única.

“Nas situações em que os investimentos são novos, a demanda é desconhecida e cujos desembolsos de Capex se concentram no início do fluxo de caixa, é recomendável algum mecanismo de compartilhamento da demanda como forma mais justa de modelagem”, afirma.

Já em concessões mais maduras,  o risco de demanda poderá ser reduzido pela metodologia do reequilíbrio econômico-financeiro: se a demanda for abaixo do esperado, o concessionário  poderá ser reequilibrado com extensão de prazo do contrato, postergação ou diminuição dos encargos de obras, ou ainda por variação da tarifa. 

Em linha com o que diz Giane Zimmer, Rui Klein, diretor de concessões rodoviárias da EcoRodovias, e Marco Aurélio Barcelos, presidente executivo da ABCR, enxergam nos projetos greenfield aqueles com maior necessidade de se compartilhar o risco da demanda, já que não possuem infraestrutura implantada. 

“Especialmente para esses projetos, a questão do compartilhamento faz muito sentido, mas acho que cabe uma análise pormenorizada para se entender os efeitos, os impactos, inclusive em termos de competitividade, em termos de precificação, por todos os possíveis licitantes”, considera Barcelos. 

Rui Klein destaca que se deve levar em consideração o ativo, o seu potencial e a previsibilidade do projeto. “Para que haja maior interesse do mercado e competitividade, pode ser necessário que a modelagem do negócio preveja o compartilhamento do risco de tráfego, com regramentos bem definidos e garantias adequadas para tal”. 

“Caso contrário, seria necessário incrementar a tarifa quilométrica ou reduzir o plano de investimentos, o que consequentemente prejudicaria a qualidade da rodovia e dos serviços prestados aos usuários”, completa. 

O que esperar nas próximas concessões?

Segundo José Carlos Cassaniga, diretor executivo de concessões rodoviárias da Perfin, o compartilhamento do risco de demanda deve constar nos lotes de concessão federal do Paraná e no Rodoanel Norte em São Paulo, previstos para o último trimestre deste ano e janeiro de 2023, respectivamente.

“Ainda há espaço para uma reflexão complementar sobre metodologias e análises de seus efeitos, de acordo com a característica de cada projeto de concessão. A expectativa do setor é de que análises públicas e seleção técnica de metodologias aplicáveis possam prosseguir”, diz. 

Josiane Carvalho de Almeida, chefe de Desenvolvimento de Negócios da CCR, ressalta que o tema “sempre foi discutido no setor e ficou mais evidente após os problemas ocorridos na terceira etapa de concessões, cujos projetos estavam mais expostos a problemas estruturais de demanda”. É importante lembrar que algumas licitações já estão adequadas ao mecanismo, como a BR-153/414/080 GO/TO (Ecovias do Araguaia) e o Rodoanel de BH. 
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Por Paulo Alfaro