Blockchain melhora serviço público na América Latina

No México, porto de Veracruz realiza testes com a tecnologia. No Brasil, BNDES lança dois projetos-piloto.

12 de agosto de 2019Infraestrutura
 Popularizada a partir do boom das criptomoedas, a tecnologia blockchain fornece soluções para os mais diversos setores, inclusive o de infraestrutura. Entre os benefícios das aplicações, estão a integração entre diferentes atores envolvidos em um projeto e os ganhos de transparência em transações, essenciais para a governança. A implementação em serviços na esfera pública já vem sendo vista em países da América Latina, caso de Brasil e México. 

O México, por exemplo, realiza testes na área de operações portuárias – o foco inicial é o novo Porto de Veracruz – com vistas a trazer transparência e segurança, e viabilizar o rastreamento de contêineres. No Brasil, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) anunciou o desenvolvimento de dois projetos-piloto: o TruBudget e o BNDES Token, cujas operações começaram em julho de 2019. 

Porto mexicano

A cidade de Veracruz analisa a implementação da tecnologia desde 2018, quando a administração portuária apresentou um projeto que previa a utilização do blockchain para trazer mais segurança às negociações. 

Inaugurado no mês de julho, o novo porto dessa localidade, considerado a principal porta de entrada e saída de mercadorias na região do Golfo do México, realiza testes com a aplicação. 

Em nota oficial, em dezembro passado, a Hutchison Ports Icave – companhia que construiu e opera o terminal – abordou o potencial da inovação, com o propósito de melhorar a eficiência comercial e a competitividade. No mês de julho, Jorge Magno Lecona, responsável pela área de Inovação da Hutchison Ports no país, confirmou a efetivação de testes de integração a partir da nova cadeia de dados, operação que permite transações transparentes, com segurança e rastreabilidade. Ele fez o anúncio em um evento local. 

"O objetivo do sistema é reduzir tempo e esforço para exportar e importar contêineres, prestando um serviço muito melhor aos clientes", disse, por sua vez, Baruc de la Fuente, administrador da Alfândega de Veracruz, também na nota.

Rastreamento de informações

Para Tatiana Revoredo, especialista em Blockchain pela Universidade de Oxford e pelo Massachusetts Institute of Technology (MIT), a rastreabilidade é um dos elementos que tornam a tecnologia interessante para o setor público, ao permitir a criação de trilhas de auditoria de informações confiáveis e simplificar a construção de plataformas para o rastreamento de informações, incluindo datas de inclusão, uso, acessos etc. 

"Isso aumenta muito a transparência em termos de processamento de dados e processos – algo importante em um ambiente governamental – e dificulta o uso indevido ou a falsificação de informações", afirma a especialista. 

Iniciativa brasileira

No Brasil, as ideias aplicadas pelo BNDES surgiram a partir de um concurso interno de inovação. "No nosso projeto, a questão da transparência foi o driver inicial. [Pensamos em] um habilitador para a hipertransparência. [O objetivo era] não apenas a divulgação do dado a  posteriori, mas tornar as transações transparentes", explica Vanessa Almeida, gerente do Departamento de Desenvolvimento de Sistemas do BNDES, responsável pela equipe que está trabalhando nas duas novas ferramentas. 

A aplicação TruBudget (Trusted Budget Expenditure Regime) foi viabilizada por meio de uma parceria com o banco de fomento alemão KfW. A motivação foi aprimorar a transparência e a eficiência no uso de recursos públicos para financiar o desenvolvimento. Baseada em tecnologia similar à da criptomoeda bitcoin, a ferramenta – de fluxo de trabalho – utiliza uma blockchain privada. 

O projeto começou em junho e a primeira operação, ainda em fase piloto, foi realizada com alguns clientes do Fundo Amazônia – projeto de financiamento não-reembolsável para ações de prevenção, monitoramento e combate ao desmatamento, e de promoção da conservação e do uso sustentável das florestas da Amazônia Legal. Quando concluída a primeira etapa, a operação será expandida a outros clientes do mesmo fundo. 

Já o BNDES Token – uma solução que permite o rastreamento da aplicação de recursos públicos em financiamento a entes públicos ou operações com recursos não-reembolsáveis – é um desenvolvimento interno. Seguindo a metodologia de uma startup, o banco de desenvolvimento brasileiro realizou a primeira fase com dois atores distintos: o governo do Estado do Espírito Santo e a Agência Nacional do Cinema (Ancine) – entidade reguladora que tem como atribuições o fomento, a regulação e a fiscalização do mercado do cinema e do audiovisual no Brasil.

Para a continuidade do projeto, o BNDES preferiu manter a atividade apenas na área da cultura. "A ideia é ter mais feedback para estender o uso da aplicação. Diferentemente do TruBudget, que conseguimos escalonar com menos alterações no sistema, no caso do BNDES Token, precisamos realizar definições [distintas]", explica Vanessa Almeida. 

"Tanto o projeto TruBudget quanto o BNDES Token são iniciativas bastante interessantes. O BNDES Token, particularmente, possui código e licença open source e introduziu uma solução de identificação digital – a certificação digital ICP-Brasil [Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira] – para que todas as transações com o dispositivo também tenham validade jurídica", considera Tatiana Revoredo.

Para ela, que é autora do livro 'Criptomoedas no cenário internacional: qual é o posicionamento de bancos centrais, governos e autoridades?' e fundadora da Oxford Blockchain Foundation, embora os desenvolvimentos do banco brasileiro estejam em estágio inicial, vêm avançando rapidamente. 

"É importante ressaltar, contudo, a importância de se esgotarem todas as fases necessárias para a implementação de uma solução blockchain, de modo que todas as possíveis questões sejam bem maturadas, dado que essa ainda é uma tecnologia em evolução e cujos efeitos não são completamente conhecidos", adiciona Tatiana. 
 

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